Java

quarta-feira, 16 de março de 2011

A Abdicação de Nicolau II - Anna Vyrubova (2ª parte)

Anna Vyrubova quando tinha sarampo
Naquela hora de agonia suprema não se disse uma única palavra sobre a perda do trono. O coração de Alexandra Feodorovna estava com o marido, os seus únicos medos eram que ele pudesse estar em perigo ou que o seu filho lhes fosse retirado. Começou imediatamente a enviar telegramas frenéticos ao imperador, implorando-lhe que voltasse para casa o mais depressa possível. Com a crueldade refinada que lhe era característica, o governo provisório devolveu os telegramas à imperatriz, escrevendo a lápis azul: "Morada da pessoa mencionada desconhecida." 

Nem esta insolênsia nem os seus medos quebraram a coragem sublime da imperatriz. Quando na manhã seguinte ela entrou no meu quarto e viu a minha cara lavada em lágrimas por já saber o que tinha acontecido, a única emoção que lhe li no rosto foi uma certa irritação por terem sido outros lábios a darem-me a notícia. "Eles deviam saber que preferia ser eu a dar a notícia," disse. Só quando deixou as suas rondas pelos quartos e ficou sozinha é que deixou a angustia surgir. "A mamã chorou muito," contou-me a pequena Maria. "Eu também chorei, mas só o que não consegui aguentar, para bem da mamã." Nunca na minha vida, de certeza, vou contemplar tanta força de espírito como a que foi mostrada naqueles dias de tragédia e desastre pela imperatriz e pelos seus filhos. Nem uma palavra de amargura ou ressentimento saiu dos seus lábios. "Sabes, Anna," disse-me a imperatriz gentilmente, "está tudo acabado para a nossa Rússia. Mas não devemos culpar o povo ou os soldados pelo que aconteceu." Sabíamos bem que ombros carregavam o peso dessa responsabilidade.

Maria Nikolaevna
Nesta altura, a Olga e o Alexei já estavam muito melhores, mas a Tatiana e a Anastásia ainda estavam muito doentes e a Maria estava a entrar na fase mais grave da doença. A imperatriz com o seu uniforme do hospital movia-se incansavelmente de quarto para quarto. Estávamos praticamente sozinhos no palácio. Nem os meus pais me podiam visitar por estarem presos em São Petersburgo.
Os dias passavam e continuávamos sem saber nada do imperador. A paciência da imperatriz estava quase a esgotar-se quando uma jovem, esposa de um oficial obscuro, que se atirou aos pés da imperatriz e implorou para ter a permissão de cumprir a dificil tarefa de levar uma até ao imperador.  A imperatriz aceitou a oferta muito agradecida e uma hora depois a corajosa mulher estava a caminho de Mogilov.  Como conseguiu chegar ao quartel-general, como passou o cordão de segurança de soldados e finalmente conseguiu entregar a carta ao imperador prisioneiro, nunca soubemos, mas demos-lhe todo o mérito por o ter conseguido.

Olga, Tatiana e Alexandra durante a Primeira Guerra Mundial
O palácio estava agora cheio de soldados revolucionários, bastante bêbados com a sua nova liberdade. As suas botas pesadas faziam barulho pelos quartos e corredores e grupos de homens sujos e de barbas por fazer estavam sempre a tentar entrar nos quartos das crianças, gritavam com vozes roucas: "Mostrem-nos o Alexei!" Pois era o herdeiro que lhes interessava acima de tudo e despertava a curiosidade da multidão. Entretanto, por detrás das portas fechadas e esperando ansiosamente a chegada do imperador, a imperatriz e os poucos que ainda lhe eram leais estavam a preparar-se para uma possível visita de Kerensky queimando cartas e diários, registos pessoais íntimos, demasiado preciosos para caírem nas mãos do inimigo.

Alexei Nikolaevich

terça-feira, 15 de março de 2011

A Abdicação de Nicolau II - Anna Vyrubova (1ª parte)

Nicolau II em 1900
Na manhã seguinte, fui para a porta e vi o carro do imperador desaparecer dos terrenos do palácio, a imperatriz e os filhos foram com ele até à estação. Como era normal nestas ocasiões, houve uma mostra de bandeiras dos guardas que se posicionavam para o saudar e o dobrar dos sinos das igrejas a despedirem-se. Tudo parecia igual, no entanto, as bandeiras, os soldados e o dobrar dos sinos estavam a acelerar o czar de todas as Rússias para a sua ruína. 

Senti-me doente nessa manhã, doente mental e fisicamente, contudo cumpri o meu dever e fui para o meu hospital onde um soldado por quem me interessei especialmente, ia ser operado e, temendo-a, implorou-me que estivesse presente. Enquanto lhe estavam a administrar a anestesia, fiquei ao lado do pobre homem, segurando-lhe a mão, mas ao mesmo tempo percebi que estava a ficar com febre e que a minha dor de cabeça estava a aumentar insuportavelmente. Quando regressei ao palácio deitei-me no meu quarto, depois de ter escrito uma nota à imperatriz onde dizia que não estaria presente para tomar chá. Uma hora depois chegou a Tatiana, complacente como sempre, mas preocupada porque tanto a Olga como o Alexei estavam de cama com temperaturas altas e os médicos achavam que eles podiam ter sarampo.

Uma semana ou duas antes, alguns cadetes da escola militar tinham passado a tarde a brincar com o Alexei e um destes rapazes tinha tosse e o rosto tão corado que a imperatriz tinha chamado a atenção de M. Gilliard para a criança, temendo que esta estivesse doente. No dia seguinte soubemos que ele tinha sarampo, mas como as nossas cabeças estavam tão preocupadas com outras coisas, nenhum de nós pensou muito no perigo de contaminação. Quanto a mim, mesmo depois da Tatiana me dizer que a Olga e o Alexei poderiam estar a sofrer a doença, não me ocorreu nem uma vez que iria ficar doente. A minha temperatura continuou a subir e a minha dor de cabeça a aumentar. Fiquei de cama durante o dia seguinte, até à hora de jantar quando a Mme. Dehn veio ter comigo e fiz um esforço inútil para me levantar e vestir. A Mme. Dehn obrigou-me a deitar outra vez e, olhando para mim cuidadosamente, disse: "Está com muito mau aspecto. Acho que vai ter de ser vista pelo médico." No instante seguinte, assim me pareceu, o médico estava no meu quarto e ouvi-o dizer: "Sarampo. Um caso grave." Depois adormeci ou desmaiei.

Anna Vyrubova com a imperatriz Alexandra
Nesse mesmo dia a Tatiana ficou doente e agora a imperatriz tinha quatro pessoas nas mãos. Vestiu o seu uniforme de enfermeira e passou todos os dias seguintes entre os quartos das crianças e o meu. Quase inconsciente, sentia-a, agradecida, as suas mãos hábeis a arranjar-me as almofadas, a acariciar-me a testa a ferver e a colocar-me medicamentos e bebidas frescas nos lábios. Ouvi vagamente que a Maria a Anastásia tinham começado a tossir, mas esta notícia preocupou-me apenas como um sonho passageiro. Estava consciente da presença da minha mãe, do meu pai e da minha irmã mais nova e, ainda dentro de uma espécie de pesadelo, percebi que eles e a imperatriz falavam em murmúrios agitados de revoltas e desordem em São Petersburgo. Mas não sei nada sobre os primeiros dias da Revolução, das greves em São Petersburgo e Moscovo, das revoltas e das manifestações e da hesitação das milícias meio-disciplinadas em restaurar a ordem, excepto sobre o que depois me aconteceu a mim. Contudo sei que a imperatriz da Rússia estava completamente calma e corajosa e que a minha irmã, depois de testemunhar as cenas selvagens de São Petersburgo, tinha dito à imperatriz que o fim estava próximo. A imperatriz acalmou-a com palavras de confiança.


Alexandra e Anna Vyrubova
Foi o devoto grão-duque Paulo, como a imperatriz depois me contou, quem lhe deu as primeiras impressões oficiais sobre o que se estava a passar e fê-la compreender que a maior das calamidades entre todas as tragédias, uma revolução política a meio de uma guerra mundial, estava a acontecer. Até nessa altura, ela não perdeu nenhuma da sua maravilhosa coragem. Não queria chamar os ministros ou os embaixadores da Aliança para a proteger a ela ou aos filhos. Com dignidade, sem vacilar, assistiu a cada dia à covarde fuga de homens que tinham vivido na Corte durante vários anos e que tinham desfrutado da confiança e amizade da família imperial. Um a um, eles foram desaparecendo, o General Racine, o conde Apraxin, oficiais e homens do corpo de segurança, criados dos mais antigos e confiáveis, sempre com desculpas suaves de quem apenas se queria salvar a si mesmo. 

Alexandra em 1916
 Uma noite chegou o barulho de revoltas e de metralhadoras que pareciam estar cada vez mais próximas do palácio. Eram cerca das onze da noite e a imperatriz estava a descansar na ponta da minha cama. Levantando-se rapido e colocando um xaile em volta dos ombros, ela foi buscar a Maria, a única dos seus filhos que estava saudável, e saiu do palácio para o ar frio para enfrentar o que a ameaçava. A guarda naval e os cossacos Konvoi ainda estavam em dever apesar de até eles se estarem a preparar para desertar. É bem possível que eles tivessem ido embora naquela noite se não fosse pela aparição da imperatriz e da sua filha. Elas foram de guarda em guarda, a imperatriz com o seu ar imperial e a Maria com coragem, e deram palavras de encorajamento, fé pura e simples e confiança, enfrentando a fúria mortal deles. Não foi preciso mais nada para que os homens permanecessem nos seus postos durante aquela noite horrível e impediu que os manifestantes atacassem o palácio. No dia seguinte os guardas desapareceram. Os guardas navais, liderados pelo grão-duque Cyril Vladimirovich, marcharam com bandeiras vermelhas para a Duma e apresentaram-se a Rodzianko como alegres revolucionários. Os mesmos homens que na noite anterior tinham louvado a imperatriz com as saudações tradicionais de "Saúde e vida longa a Vossa Majestade!"

Maria Nikolaevna
Agora não havia praticamente ninguém dentro ou fora do palácio para defender a família imperial no caso de a multidão decidir atacar. Mesmo assim a imperatriz permaneceu calma, dizendo apenas que esperava que nenhum sangue tivesse de ser derramado para a proteger. Um telegrama do imperador revelou que ele já sabia da crise e por isso implorava que a imperatriz e os filhos se juntassem a ele no quartel-geral. No mesmo momento chegou uma mensagem espantosa de Rodzianko, agora chefe do Governo Provisório, a avisar a imperatriz de que ela e a sua família tinham de deixar o palácio de uma vez. A sua resposta para ambas as mensagens foi a de que não podia sair porque todos os seus filhos estavam gravemente doentes. A resposta de Rodzianko a este apelo desesperado de uma mãe foi: "Quando a casa estiver a arder, é altura de deitar tudo fora." A imperatriz consultou médicos e enfermeiras desesperadamente. As crianças podiam ir para outro sitio? E a Anna? O que poderia fazer se o governo se revelasse impiedoso?

Anastásia, Tatiana e Maria durante a Primeira Guerra Mundial
A este dilema da mãe, acrescentou-se a terrível notícia da abdicação. Não pude estar com ela nesta hora de dor, nem sequer a vi até á manhã seguinte. Foram os meus pais que me deram a notícia, mas estava demasiado doente para a compreender. A Mme. Dehn, que estava com a imperatriz na noite em que o grão-duque Paulo chegou com a fatal notícia, descreveu a cena quando a imperatriz, de coração partido, deixou o grão-duque e regressou ao seu quarto. 

"A cara dela estava distorcida com a agonia, os seus olhos estavam cheios de lágrimas. Mancava em vez de andar e eu suportei-a até ela conseguir chegar à secretária que ficava entre as janelas. Encostou-se fortemente contra ela e, segurando as minhas mãos nas suas, disse tristemente: 'Abdique'. 

Mal podia acreditar nos meus ouvidos. Esperei pelas suas próximas palavras. Mal as consegui ouvir. Finalmente [ainda a falar francês porque a Mme. Dehn não falava inglês] disse: 'Pobrezinho - sozinho ali e a sofrer - Meu Deus! O que ele deve ter sofrido!'

Fotografia de noivado de Nicolau e Alexandra

segunda-feira, 14 de março de 2011

Notícias - Restos Mortais de Maria e Alexei Podem Ficar em Moscovo

Maria e Alexei no lago do Palácio de Alexandre
Os restos mortais da grã-duquesa Maria e do czarevich Alexei chegaram a Moscovo esta segunda-feira de manhã (21 de Fevereiro). 

Maria e Alexei eram dois dos filhos de Nicolau II, o último czar da Rússia, e a identidade dos corpos só foi confirmada em 2007

O último lugar de repouso dos corpos imperiais depende de uma ordem do Kremlin, depois da chefe da Família Romanov ter escrito ao Presidente Medvedev, da Suíça, pedindo que uma comissão do governo determinasse o seu destino final, disse o Moskovsky Komsomolets.

Maria Nikolaevna
Os últimos a aparecer 

A família imperial foi canonizada em 2000, após a sua execução pelos bolcheviques na noite de 17 de Julho de 1918.
Os corpos do czar Nicolau II, da czarina Alexandra e das grã-duquesas Olga, Tatiana e Anastásia foram descobertos numa cova na floresta que rodeia Ekaterinburgo. Foram sepultados em São Petersburgo em 1998.

Os corpos de Alexei e Maria foram separados do resto da família pelos carrascos que tentaram queimá-los, mas não conseguiram. Os dois corpos foram recuperados em 2007. 

Alexei com um dos seus tutores


No limbo

O pedido dos Romanov foi apresentado em Maio de 2008, citando os testes genéticos que confirmavam a identidade das crianças mortas. Os restos mortais ficaram guardados na morgue de Ekaterinburgo durante três anos à espera de uma resposta.

Contudo, enquanto estes restos mortais podem vir a ter um funeral de estado e ser enterrados junto da restante família no mausoléu dos Romanov em São Petersburgo, existe também a possibilidade de que venham a ter outro destino.

Sem um decreto presidencial que permita que os corpos sejam enterrados na Catedral de Pedro e Paulo ou outro lugar prestigioso, não haverá outra alternativa senão depositá-los num cemitério público algures em Moscovo. 

Alexei e Maria (ao centro e 2.ª da direita) com os irmãos em Livadia, 1912

sábado, 12 de março de 2011

Félix Yussupov Sobre a Coroação do czar Nicolau II em 1896

Príncipe Félix Yussupov
Em 1896, quando o imperador Nicolau II chegou ao trono, fomos até Arkhangelskoye em inicios de Maio para receber os numerosos convidados que iriam participar nas festividades da coroação. Entre estes encontravam-se o príncipe-herdeiro da Roménia e a sua esposa, a princesa Maria. Em sua honra, os meus pais contrataram uma orquestra romena que na altura era muito conhecida em Moscovo. Um dos músicos era um certo Stefanesco, um grande tocador de pratos que se viria a tornar num dos meus amigos mais íntimos. Acompanhava-me frequentemente em viagens. Gostava muito de o ouvir tocar, algo que ele fazia frequentemente só para mim durante noites inteiras. 

O grão-duque Sérgio e a grã-duquesa Isabel também tinham convidado um grande número de amigos e parentes para visitarem Elinskoie, a sua propriedade em Moscovo, que ficava a cerca de quatro quilómetros da nossa. Por isso o casal e os seus convidados eram uma presença assídua nas festas em Arkhangelskoye. O imperador e a imperatriz também vieram a estas festas que eram quase tão magnificas como os bailes da corte.

O príncipe-herdeiro Fernando da Roménia com a sua esposa, a princesa Maria
Abrimos o nosso teatro privado para estas festividades. Os meus pais mandaram vir a Ópera Italiana de São Petersburgo com Mazzani, Madame Arnoldson e a companhia de ballet. Uma noite, antes de cortina subir no Fausto, disseram à minha mãe que a Mme. Arnoldson se recusava a cantar porque, na cena do jardim, os canteiros estavam cheios de flores verdadeiras e o seu cheiro deixava-a enjoada. As flores tiveram de ser substituídas por arbustos para que ela prosseguisse. Nunca me irei esquecer de outra actuação no nosso teatro: todos os convidados estavam sentados nos seus camarins, os estábulos foram desmontados e, no sitio deles, foi plantado um jardim de rosas cuja fragrância enchia o ar.

No fim do espectáculo, toda a gente se encontrou no terraço onde foi servida a ceia em mesas iluminadas por castiçais altos. No final houve fogo-de-artificio, uma visão encantadora tão deslumbrante para mim quando era pequeno que tinha a esperança de que ninguém me mandasse para a cama.

Félix Yussupov (em pé, à direita) com os pais e o irmão mais velho
Os meus pais e os seus convidados foram ainda passar alguns dias a Moscovo antes da coroação para participarem noutra vaga de festas. A nossa casa em Moscovo, que antes tinha sido uma espécie de chalé de caça de Ivan, o Terrível, mantinha os traços do século XVI: grandes salas abobadas, mobília medieval, ouro ricamente talhado e baixelas de prata. Todo este esplendor oriental era um cenário perfeito para as festas dadas pelos meus pais. Os príncipes estrangeiros que participavam nelas diziam que nunca tinham visto nada igual.

O meu irmão e eu ficamos em Arkhangelskoye, uma vez que éramos considerados demasiado novos para participar nestes eventos. Mas tivemos autorização para ir a Moscovo para ver a coroação. Só tenho de fechar os olhos neste momento para ver mais uma vez o Kremlin iluminado com os seus telhados vermelhos e verdes e cúpulas douradas.

Félix (direita) com o irmão Nicolau
Na manhã da coroação vimos a procissão sair do Palácio Imperial e ir na direcção da Catedral de Ouspensky. Depois da cerimónia, o czar e as duas czarinas, vestidos com as suas roupas da coroação e com as coroas na cabeça, seguidos da família imperial e dos príncipes estrangeiros, deixaram a catedral para regressar ao palácio. O sol estava particularmente brilhante nesse dia e fazia brilhar o ouro e as pedras preciosas das roupas. Uma visão destas só podia acontecer na Rússia. Quando o czar e as duas czarinas apareceram perante o seu povo, eram verdadeiramente os escolhidos pelo Senhor. Quem poderia adivinhar que vinte e dois anos depois nada ficaria desta majestade e esplendor?

Diz-se que enquanto as damas-de-companhia vestiam a czarina para a cerimónia, uma delas picou o dedo no broche do manto imperial e que uma gota de sangue caiu no arminho...

Coroação de Nicolau II em Moscovo, 1896
Três dias depois, aconteceu a terrível tragédia de Khodinka que pôs toda a Rússia de luto. Muitos viram-na como um mau agouro para o reinado. A grande maioria das festas que tinham sido planeadas para depois da coroação foram canceladas. Contudo, seguindo o mau conselho de alguns dos seus conselheiros, Nicolau II decidiu estar presente num baile dado na embaixada francesa. Houve uma grande divergência entre os grão-duques. Os três irmãos do grão-duque Sérgio, na altura governador-geral de Moscovo, queriam minimizar a importância da catastrofe pela qual o grão-duque Sérgio era em parte responsável. Diziam que o programa de festejos da coroação devia prosseguir como estava programado. Os quatro Mikhailovichi (o meu futuro sogro, o grão-duque Alexandre, e os seus irmãos) opuseram-se firmemente a este ponto de vista e, por isso, foram acusados de estarem a conspirar contra os mais velhos.

Grão-duque Alexandre Mikhailovich
Depois da coroação, os meus pais regressaram a Arkhangelskoye com os seus convidados, incluindo o príncipe Fernando da Roménia e a princesa Maria. O príncipe Fernando era sobrinho do rei Carlos I da Roménia. Lembro-me perfeitamente do rei Carlos, uma vez que ele visitava a minha mãe com frequência. Era bonito e tinha um olhar majestoso, com o cabelo a ficar grisalho e as feições de uma águia. Dizia-se que o rei apenas se interessava por política e dinheiro, dando pouca atenção à sua esposa, a princesa de Wied, que era muito conhecida na altura como escritora com o pseudónimo de Carmen Sylva. Uma vez que eles não tinham filhos, o príncipe Fernando era herdeiro do trono. Era um homem atraente, mas não tinha personalidade, era extremamente tímido e indeciso tanto em público como em privado. Até seria um homem bonito se as suas orelhas não se destacassem tanto, algo que estragava o seu aspecto. Tinha-se casado com a princesa Maria do Reino Unido, a filha mais velha da duquesa de Saxe-Coburgo-Gota, irmã do imperador Alexandre III.

Carlos I da Roménia com a esposa Isabel de Wied e a única filha do casal, Maria, que morreu aos 3 anos de idade
A princesa Maria já era conhecida pela sua beleza: tinha olhos maravilhosos de um azul-acinzentado raro e impossíveis de esquecer. Era alta e magra quando era mais nova e enfeitiçou-me tão completamente que eu andava atrás dela como uma sombra. Passava noites inteiras acordado a lembrar-me do seu lindo rosto. Uma vez ela deu-me um beijo. Fiquei tão feliz que não deixei que me lavassem a cara nessa noite. Ela achou a história tão divertida que quando a voltei a encontrar muitos anos depois num jantar dado na embaixada austríaca em Londres, lembrou-me do incidente. 

Maria da Roménia
Foi na altura da coroação que testemunhei uma cena que marcou particularmente a minha infância. Um dia, quando estavamos sentados à mesa, ouvimos um barulho na sala ao lado. A porta abriu-se e um jovem muito bonito entrou a cavalo. Trazia consigo um ramo de rosas que atirou aos pés da minha mãe. Era o príncipe Gritzko Wittgenstein, um oficial da guarda do czar, um homem muito atraente, conhecido pelas suas extravagâncias e que gostava de todas as mulheres, velhas e novas. O meu pai ficou furioso com a audácia do jovem oficial e proibiu-o de voltar a entrar na casa dele outra vez.

Não consegui compreender a fúria do meu pai. Fiquei indignado por ele ter insultado um homem que, a meu ver, era um herói, a reencarnação dos cavaleiros de Yore, um cavalheiro que declarava o seu amor sem medo através de um gesto tão nobre!

Zenaida, mãe de Félix
Este texto foi retirado do livro "Lost Splendor" escrito pelo príncipe Félix Yussupov

Félix Yussupov

Casamentos Morganáticos - Paulo Alexandrovich e Olga Valerianovna Paley

Olga Paley e Paulo Alexandrovich
O grão-duque Paulo Alexandrovich, filho mais novo do czar Alexandre II, sempre tinha levado uma vida calma, seguindo rigorosamente os padrões impostos a um membro da realeza. Quando nasceu, o casamento dos pais já se encontrava, para todos os efeitos, acabado e a sua mãe começava a mostrar os primeiros sintomas de tuberculose, que a obrigavam a passar o inverno longe do clima rigoroso da Rússia. Por este motivo, Paulo passou grandes períodos da sua infância no estrangeiro, principalmente no sul de França e em Hesse-Darmstatd na companhia da mãe, da irmã Maria e do irmão Sérgio. Assim, Paulo tinha uma mentalidade mais aberta ao Ocidente e uma educação mais refinada do que os seus irmãos mais velhos, embora tivesse sido um grande patriota russo ao longo da sua vida.

Paulo Alexandrovich em criança
Por ter sido criado longe da Corte, Paulo tornou-se muito tímido e pouco dado à pompa e circunstância desta. A sua adversão por cerimónias e formalidades seria uma constante ao longo de toda a sua vida. O facto de ter herdado a constituição e saúde fracas da mãe ajudavam ao seu isolamento. Depois da morte da mãe em 1880, quando Paulo tinha 20 anos, a grã-duquesa Olga Constantinovna, sua prima em segundo grau, sugeriu que ele devia trocar o sul de França pela Grécia. Tal como a imperatriz Maria, Paulo tinha problemas de pulmões que o forçavam a refugiar-se do inverno rigoroso russo e, por isso, aceitou a sugestão.

Embora já conhecesse a sua prima Alexandra da Grécia das visitas que esta tinha feito à família na Rússia, foi durante as suas estadias na Grécia que Paulo a começou a conhecer melhor e foi lá que ele a viu crescer. Nas suas primeiras visitas ela era ainda uma criança de 10 anos, mas à medida que crescia, Alexandra foi-se apaixonando pelo seu primo Romanov e ele viu-se subitamente a sentir o mesmo. No entanto, antes de começar a nutrir sentimentos pela sua prima grega, corriam rumores em São Petersburgo de que Paulo estava apaixonado pela nova esposa do seu irmão Sérgio, a grã-duquesa Isabel Feodorovna, principalmente porque ele tinha ido com o irmão e a cunhada na sua lua-de-mel. Estes rumores nunca foram confirmados, mas é provável que tenham tido um fundo de verdade.
Paulo e Sérgio com o grão-duque Luís III de Hesse-Darmstadt e as suas primas Isabel e Irene
Paulo e Alexandra casaram-se no dia 17 de Junho de 1889 e tiveram um casamento extremamente feliz e harmonioso. Sérgio e Isabel continuaram a ser uma constante na vida de Paulo, já que os dois casais passam a maioria do tempo juntos e viviam em palácios próximos. Mesmo quando Sérgio foi nomeado Governador-geral de Moscovo na primavera de 1891, Paulo e Alexandra continuaram a visitar o casal muito frequentemente.

A primeira filha do casal, a grã-duquesa Maria Pavlovna, nasceu nove meses e um dia depois do casamento. Foi muito desejada e mimada pelos pais e pelos tios que ainda não tinham tido filhos. Menos de 6 meses depois do nascimento de Maria, Alexandra estava novamente grávida.

Quando estava no sétimo mês de gestação, Sérgio e Isabel convidaram Paulo e Alexandra para passar férias em Moscovo com eles na companhia da filha Maria. Durante um passeio pelos jardins, Alexandra decidiu saltar directamente da margem para um barco que estava atracado no lago e caiu. A principio nada aconteceu, mas no dia seguinte, durante um baile dado em sua honra, Alexandra desmaiou e pouco tempo depois deu à luz o seu segundo filho, Dmitri, prematuramente. O bebé sobreviveu, mas Alexandra entrou em coma e morreu seis dias depois.

Paulo com a sua primeira esposa, Alexandra
Paulo ficou muito afectado com a morte da esposa. No dia do funeral tentou atirar-se para dentro da cova quando o caixão estava a ser enterrado, mas foi impedido por Sérgio, pelo grão-duque Constantino Constantinovich (tio de Alexandra) e outros membros da família. Depois do golpe, a família decidiu enviar Paulo para a Criméia para descansar enquanto que os seus filhos foram deixados com os tios em Moscovo. A estadia durou quase um ano, mas quando regressou Paulo parecia ter recuperado parte da sua vitalidade.

Passou a viver com os filhos em São Petersburgo, algo que entristeceu Sérgio que se tinha afeiçoado aos sobrinhos. Lá a família vivia calmamente. Paulo foi forçado a contratar amas e governantas, mas fazia questão de tomar todas as refeições na companhia dos filhos. Durante muitos anos ninguém acreditava que o grão-duque se fosse voltar a casar ou sequer encontrar uma amante apesar do encorajamento para tal por parte do seu irmão Vladimir Alexandrovich de quem se tinha aproximado após a morte da esposa.

Paulo com os filhos Maria e Dmitri, o irmão Sérgio e a cunhada Isabel
No entanto, os acontecimentos começaram a mudar rapidamente quando, em 1895, o grão-duque Vladimir Alexandrovich contratou um novo ajudante-de-campo chamado Erich von Pistohlkors que Paulo conheceu durante uma visita ao palácio do irmão. Erich gostou tanto do grão-duque que, algum tempo depois, durante uma parada militar em São Petersburgo, fez questão de o apresentar à sua esposa e mãe dos seus três filhos, Olga Valerianova von Pistohlkors.

Olga era filha de um médico proeminente de Czarskoe Selo e tinha-se casado com o General von Pistohlkors em 1884, tornando-se uma figura conhecida entre a sociedade aristocrática de São Petersburgo pela sua inteligência e personalidade alegre, descontraída e extrovertida. Todos pensavam que tinha um casamento harmonioso com o marido, mas a verdade era que, como muitos outros homens da sua época, Erich tinha amantes e a própria Olga gostava de correr riscos ao seduzir vários homens da aristocracia e nobreza para se vingar do marido. Entre os homens com quem tinha namoriscado inocentemente incluía-se o próprio grão-duque Vladimir que esteve apaixonado por ela durante um breve período. Mas com Paulo foi diferente.

Olga Valerianovna com o seu primeiro marido Erich

Olga gostava da simplicidade de Paulo, das suas conversas inteligentes, do charme da sua timidez natural e, acima de tudo, do amor e fidelidade com que recordava a sua esposa Alexandra. Em resumo, era o completo oposto do seu marido. Paulo, por seu lado, gostava de Olga porque ela era o seu completo oposto: era positiva, adorava a vida em sociedade e era extrovertida, no entanto receava que um envolvimento com ela fosse uma ofenda para Erich.

No entanto, o seu irmão Vladimir diminuiu a importância que o seu irmão queria dar à moralidade do caso. Quando percebeu que Paulo estava finalmente interessado em ter um caso com uma mulher mais de quatro anos depois da morte da sua esposa, não só o apoiou como encorajou, revelando que Erich também tinha as suas amantes e que o casamento era uma fachada. Na altura Vladimir queria apenas que o irmão se distraísse e talvez um caso amoroso sem importância lhe desse vontade suficiente para que ele começasse a procurar uma segunda esposa entre as casas reais europeias.
Olga Valerianovna
O caso acabou por acontecer. Paulo e Olga começaram a encontrar-se discretamente e, durante muito tempo, nem o marido dela desconfiou do que estava a acontecer, apesar de Paulo nunca ter gostado da ideia de a sua amante continuar casada. Vladimir tinha esperado que o romance durasse apenas alguns meses, mas quando ao fim de um ano continuava e que Paulo era cada vez menos cuidadoso, começou a ficar preocupado.

As suas preocupações ainda se tornaram maiores quando, em Janeiro de 1897, Olga deu à luz um filho que todas as circunstâncias indicavam ser de Paulo. Foi a partir daí que o grão-duque se cansou de esconder. Assim que soube do nascimento da criança, trouxe os dois consigo para o seu palácio de São Petersburgo e o escândalo rebentou. A criança foi chamada de Vladimir, em honra do tio através do qual os seus pais se tinham conhecido, mas como Olga continuava casada, a lei obrigou a que ele recebesse o apelido do marido dela. Paulo ficou indignado.

Vladimir, o primeiro filho de Paulo e Olga
Pouco tempo depois do nascimento, Paulo foi falar com o seu sobrinho, o czar Nicolau II e informou-o do caso que tinha mantido e do seu filho, pedindo-lhe que permitisse um divórcio entre Olga e o marido. O czar ficou chocado e recusou-se a fazê-lo. Paulo não aceitou a resposta.

Para chamar as atenções do sobrinho, começou a passear publicamente com Olga, os filhos do primeiro casamento e o novo bebé, escandalizando ainda mais a sociedade de São Petersburgo e, durante um baile no Palácio de Inverno que tinha sido organizado pelo czar e pela esposa, resolveu aparecer com Olga, ainda casada, pelo braço. O casal foi educadamente convidado a sair pela imperatriz e no dia seguinte Paulo foi chamado ao palácio. Nicolau concordou em dar o divórcio a Olga, mas apenas com a condição de que o tio não se casaria com ela. Paulo deu a sua palavra, mas tinha todas as intenções de quebrá-la.

Paulo e Olga com o grão-duque Alexei Alexandrovich
Pouco tempo depois de Olga se ter divorciado oficialmente e de Paulo ter enviado os seus dois filhos do primeiro casamento para casa dos tios, o casal fugiu da Rússia com o filho Vladimir. Durante dois anos os três andaram de hotel em hotel por toda a Europa, na esperança de que Nicolau lhes desse permissão para casar, mas tal nunca aconteceu.

Finalmente, no verão de 1902, o casal cansou-se de esperar e casou-se numa igreja em Itália. Assim que a notícia chegou aos ouvidos do czar, Paulo perdeu todos os seus títulos e posições militares assim como o direito de viver na Rússia permanentemente. Durante este período o grão-duque ainda tentou obter a custódia da sua filha Maria, mas a sugestão foi recusada. Os seus dois filhos do primeiro casamento passaram a viver permanentemente com os tios.

Paulo com a filha Irina
Depois do casamento Paulo comprou uma casa em Bologne-sur-sein e passou a viver lá com a sua nova família. Pouco mais de um ano depois do casamento nasceu uma filha que o casal chamou de Irina. Um ano depois dela Olga deu à luz outra menina chamada Natália.

A vida em Paris era calma e idealista. O casal tornou-se a sensação da cidade e por isso tinha uma vida social muito activa. Mesmo assim a família tomava todas as refeições junta, rezava e quase todos os dias conviviam durante uma hora antes de ir dormir, costumes muito raros da aristocracia e nobreza da época. Paulo ressentia-se por estar longe da Rússia e dos seus dois filhos mais velhos, por isso começou a afastar-se cada vez mais da política e a refugiar-se na sua vida familiar.

Paulo com a esposa Olga, os seus três filhos Vladimir, Irina e Natália e os três filhos do primeiro casamento de Olga: Alexandre, Olga e Mariana
Paulo só voltaria à Rússia em 1905 aquando da morte do seu irmão Sérgio. Queria assistir ao funeral dele em Moscovo, mas o czar proibiu-o por temer novos ataques contra grão-duques. Mais uma vez quis levar a sua filha Maria consigo para Paris, mas o czar não permitiu que tal acontecesse, visto que Maria pertencia à coroa e não ao pai. Mais tarde, durante esta visita, Paulo percebeu que Dmitri em particular não queria deixar a tia, uma vez que após a morte do tio Sérgio, sentia que era sua responsabilidade protegê-la. Maria também nunca se separaria do irmão, por isso Paulo acabou por aceitar a decisão do czar.

Quatro anos depois, Paulo descobriu através de uma carta de Maria que esta se encontrava noiva do príncipe Guilherme da Suécia sem que a sua autorização tivesse sido pedida. Paulo ficou furioso e viajou propositadamente à Rússia só para falar pessoalmente com o czar que jurou não ter tido nada a ver com o assunto. O casamento tinha sido arranjado numa colaboração entre Isabel Feodorovna e a sua irmã mais nova, a princesa Irene de Hesse-Darmstadt. Depois de falar com o pai, Maria chegou a considerar pensar melhor na união, mas numa carta Irene disse-lhe que se ela desistisse do casamento iria matar a sua tia Isabel e, por isso, decidiu seguir em frente com a união.

Paulo ameaçou não estar presente se a sua esposa e filhos não o pudessem acompanhar, mas depois de uma conversa com a filha acabou por aparecer. O casamento revelou-se um desastre. Embora tivesse tido um filho, Maria viria a separar-se do marido pouco mais de 3 anos depois, passando a viver com o pai e os meios-irmãos em Paris. O divórcio foi oficializado em 1914.

Paulo com os filhos Dmitri e Maria
1914 foi também o ano em que Paulo finalmente regressou à Rússia com a esposa e os filhos. Depois de uma onda de remorso por ter apoiado o casamento de Maria sem pedir a opinião de Paulo, a imperatriz Alexandra Feodorovna convenceu o marido a perdoar o tio em 1912. Assim que soube da notícia, Paulo comprou um terreno no Parque de Alexandre, em Czarskoe Selo e começou a construir um palácio para a família.

As obras ficaram concluidas no final de 1913 e a família mudou-se na Primavera de 1914. Os primeiros meses foram muito calmos e alegres. Vladimir, que já se tinha mudado para a Rússia em 1912 para começar a sua carreira militar, fez grande sucesso na família devido aos seus inúmeros talentos como poeta, pintor e músico e as duas filhas mais novas foram muito bem recebidas pela sua graciosidade. Olga teve mais dificuldade em ser aceite, mas aos poucos foi conseguindo ganhar o respeito da família.

No entanto os dias de felicidade acabaram com o rebentar da Primeira Guerra Mundial no verão.

Palácio Paley em Czarskoe Selo
Vladimir foi imediatamente enviado para as trincheiras, mas Paulo não pôde juntar-se ao filho devido aos graves problemas de saúde que o afligiam na altura. Olga abriu uma oficina no salão de baile do palácio patrocionado pela imperatriz Alexandra que confeccionava sacos-cama e outros produtos de primeira necessidade para os soldados russos.
Paulo não aguentou muito tempo em casa. Logo em 1916 quando começou a melhorar foi nomeado General de um regimento e partiu para a guerra.

Vladimir Paley durante a Primeira Guerra Mundial
Quando rebentou a Revolução Russa em 1917, os Paley foram das últimas famílias Romanov a ser abordada pelo governo de Kerensky. O novo líder chegou a decretar a prisão domiciliária da família em Junho de 1917, mas graças à intervenção de Mariana, filha de Olga, que conhecia os oficiais mais importantes do regime, foram libertados poucas semanas depois.

No entanto, quando rebentou a revolução bolchevique em Outubro desse ano, os dias de calma acabaram. Muitos aconselharam Paulo e Olga a fugir da Rússia enquanto tinham tempo, mas nenhum dos dois reconheceu a gravidade da situação até ser tarde demais. Logo no mês seguinte apareceu um anúncio do jornal que convocava todos os grão-duques e príncipes Romanov para que estes se apresentassem na sede da Cheka em São Petersburgo para se registarem nos seus cadernos. Na altura o grão-duque Paulo estava gravemente doente com uma úlcera no estômago, por isso a sua esposa apareceu em seu nome. Os oficiais da Cheka não ficaram satisfeitos e exigiram que no dia seguinte Vladimir se apresentasse mesmo apesar de não ser um Romanov.

Quando Vladimir se encontrou com os oficiais, estes apresentaram-lhe dois documentos. Num deles era pedido que Vladimir Pavlovich negasse a paternidade do grão-duque Paulo, o outro era uma ordem de exílio. O príncipe escolheu o segundo e partiu para Volodga, na Sibéria em Março de 1918. Foi a última vez que viu a família.

Paulo em 1916, uma das suas últimas fotografias
Paulo conseguiu escapar às primeiras vagas de detenção de membros da família imperial devido ao seu delicado estado de saúde, mas não por muito tempo. A última vez que foi visto em público livremente foi no baptizado do seu neto, Roman Sergeievich Putiatin, filho do segundo casamento da sua filha Maria Pavlovna, no dia 18 de Julho de 1918. A família não fazia a minima ideia que nessa mesma noite Vladimir seria assassinado na Sibéria.

O grão-duque foi preso em Agosto. Olga fez tudo ao seu alcance para o conseguir libertar, passando todo o tempo que podia em São Petersburgo a visitar o marido ou a tentar encontrar-se com oficiais bolcheviques. Os seus esforços acabaram por ser em vão. Em Janeiro de 1919, extremamente débil, Paulo foi fuzilado como um prisioneiro comum. Na altura estava tão fraco que foi alvejado quando estava deitado numa maca.

Olga Paley depois da morte do marido
Olga nunca recuperou do choque da morte do marido. Depois da sua morte fugiu para a Finlândia onde já se encontravam as suas filhas onde descobriu que tinha um cancro de mama. Conseguiu recuperar, mas quando ainda estava em convalescença recebeu outra notícia que a deixou de rastos: em Setembro um grupo de soldados do exército branco descobriu o corpo de Vladimir juntamente com outros membros da família.
Apesar dos seus esforços, os corpos não puderam seguir para Paris, por isso Olga não pôde assistir ao funeral do filho. Olga passou os restantes dez anos da sua vida em Paris, junto das filhas. Irina casou-se em 1924 com o seu primo, o príncipe Feodor Alexandrovich Romanov e Natália em 1927 com o estilista Lucien Lelong. 

Olga morreu em 1929, em Paris, de cancro.

Olga Paley com a filha Natália

terça-feira, 8 de março de 2011

A relação de Alexandra Feodorovna com a rainha Vitória

Alexandra em Inglaterra na companhia da sua avó Vitória, do tio Eduardo VII, do marido e da filha Olga

A morte da avó foi muito lamentada pela imperatriz. A rainha Vitória tinha sempre sido uma ligação especial à mãe de quem ela mal se lembrava, assim como uma avó muito carinhosa. A rainha gostava muito dos seus netos de Hesse e a família achava que a Alice era a sua preferida. O que a rainha sentia era, antes de mais, influenciado pela pena que sentia daquela menina sem mãe. Mas a rainha e a imperatriz também tinham muitas características em comum, algo de que ela se apercebeu rapidamente. A imperatriz Alexandra possuía o coração bondoso da rainha, a sua capacidade de se entusiasmar rapidamente tanto com ideias como   com pessoas, o mesmo sentido de dever e a mesma fidelidade nas amizades. 

A rainha Vitória sempre mostrou muito interesse pelos seus netos. Sempre se tinha mantido em contacto com as pessoas que os rodeava e tinha assumido um papel importante nas suas vidas. Quando foi a Coburgo para assistir ao casamento do seu neto, o grão-duque de Hesse, é possível que já lhe tivesse ocorrido arranjar um noivado em simultâneo para a princesa Alice. De qualquer das formas, a rainha estava lá, naquele momento importante, pronta para dar o apoio e bons conselhos que a neta poderia ter pedido à mãe nesta altura. A rainha, por muito que gostasse do imperador Nicolau, arrependia-se muito silenciosamente por a sua "querida Alice" ir viver demasiado longe para a puder visitar. "Eu tenho direito a tê-la," costumava dizer a rainha pateticamente. 

A rainha Vitória com os seus netos de Hesse

A imperatriz, por seu lado, numa carta à princesa Bariatinsky do dia 16 de Julho de 1900, disse sobre a rainha:
A minha avó convidou-nos a ir visitá-la a Inglaterra, mas agora não é decididamente o momento certo para sair do país. Podes imaginar como tenho vontade de ver a carinha querida e velha dela. Nunca estivemos separadas durante tanto tempo - 4 anos inteiros - e tenho a sensação que nunca mais a vou voltar a ver. Se não fosse tão longe eu tinha lá ido sozinha passar alguns dias para vê-la e teria deixado as crianças com o meu marido, já que ela tem sido uma mãe para mim, desde que a mamã morreu há 22 anos.
Ela, que nunca deixava o marido, até pensou em ir sozinha visitá-la, mas as crianças ficaram doentes e ela não pôde levar o seu plano avante.

Alexandra com o seu tio Leopoldo, o filho da rainha Vitória que sofria de hemofilia
Quando soube da morte da rainha, a imperatriz queria ir imediatamente para Windsor com o irmão. Contudo foi persuadida a não o fazer uma vez que se encontrava grávida na altura (a quarta grã-duquesa, Anastásia, nasceu no inicio do verão seguinte). Foi-se muito abaixo durante o serviço fúnebre que se realizou na igreja inglesa de São Petersburgo.
Como te invejo [escreveu ela à sua irmã Vitória] por teres podido ver a querida avó ser levada para o seu último local de repouso. Não consigo acreditar que ela tenha mesmo morrido, que nunca mais a vamos voltar a ver. Parece impossível. Desde que nos lembramos, ela sempre foi a nossa vida e nunca houve um ser mais gentil e querido. O mundo inteiro está de luto por ela. A Inglaterra sem a rainha parece impossível. Estou muito agradecida por ela ter sido poupada a sofrimento físico. Mas moralmente teve muito que suportar este ano. (28 de Janeiro de 1901)
Alexandra com o irmão Ernesto, a irmã Irene e o cunhado Henrique da Prússia
"Ela era a nossa vida" explica o grande vazio que a morte da rainha deixou na imperatriz. Agora não existia nenhuma autoridade mais velha a quem ela pudesse pedir conselhos. Passou a fazer os seus próprios julgamentos e teve de se guiar pela sua própria luz. Desde o seu casamento, a imperatriz tinha-se mantido em contacto com a avó por carta. A rainha Vitória tinha sempre temido que a sua reserva e timidez levariam a que a imperatriz ser incompreendida e foi provavelmente por essa razão que, além do grande interesse que mostrava pela família da imperatriz, a rainha também beneficiava a sua neta preferida com a sua vasta experiência. Todas as cartas trocadas entre a imperatriz e a rainha (as que ela enviou à avó foram-lhe oferecidas depois da sua morte) foram destruídas em Março de 1917 pela própria que não queria coisas que lhe eram tão preciosas nas mãos dos bolcheviques.

Alexandra


Texto retirado do livro "The Life and Tragedy of Alexandra Feodorovna", uma biografia escrita pela baronesa Sofia Buxhoeveden.

Casamentos Morganáticos - Alexei Alexandrovich e Alexandra Zhukovskaya

Grão-duque Alexei Alexandrovich
 Esta união parece ter sido a mais confusa da história da família Romanov. É um facto que Alexei Alexandrovich, filho do czar Alexandre II e da sua esposa Maria Alexandrovna, teve um caso com Alexandra Zhukovskaya entre finais da década de 1860, inicios da década de 1870, mas o ponto a que este caso chegou continua a ser muito debatido pelos historiadores.

Alexandra Zhukovskaya
Alexei conheceu Alexandra por esta ser uma das damas-de-companhia da sua mãe. Ela era uma grande amiga de Maria Mescherskaya, a primeira amante conhecida do czar Alexandre III que quase o fez abdicar dos seus direitos de sucessão ao trono antes do seu casamento com a princesa Dagmar da Dinamarca e, também ela, uma dama-de-companhia da imperatriz. O czar Alexandre II descobriu ambos os casos dos filhos e não aprovou nenhum deles, especialmente o de Alexei, visto que Alexandra era filha de um filho ilegítimo, nascido de um caso de um grande proprietário com uma escrava turca.

Embora tenha conseguido resolver o caso de Alexandre com relativa facilidade quando o enviou à Dinamarca para conhecer a antiga noiva do seu irmão mais velho, o czar viu-se com dificuldades acrescidas no caso de Alexei quando, no dia 26 de Novembro de 1871, esta deu à luz um filho do grão-duque chamado de Alexei em sua honra. A partir daqui o que terá acontecido continua a ser uma incógnita.

Alexei
Alguns dizem que Alexei e Alexandra se casaram, mas que o casamento foi anulado pela Igreja Ortodoxa por ter sido realizado sem a autorização do czar. No entanto, nesta época, a lei que dizia respeito a casamentos morganáticos apenas excluía os descendentes destes da sucessão, não proibindo necessariamente que a união se oficializasse ou que os infractores fossem castigados. A lei mais restrita apenas viria a ser aprovada em 1887. Não existem registos de um casamento ou sequer de que Alexei tenha pedido para este se realizar, mas estes podem ter sido destruídos após um possível anulamento.

Alexandra foi convidada a sair da Rússia juntamente com o filho pelo imperador e ambos passaram a viver em Paris sem qualquer título. Ao mesmo tempo Alexei foi enviado para uma longa viagem pela América. Só muito mais tarde o seu filho Alexei viria a receber o título de barão Seggiano pela República de San Marino. O título russo de conde Belevsky-Zhukovsky apenas lhe foi conferido após a morte de Alexandre II e subida ao trono do seu tio, Alexandre III.

Alexei Alexandrovich nunca se casou depois do seu caso com Alexandra, mas acredita-se que poderá ter tido outros filhos ilegítimos devido à sua fama de Don Juan da família Romanov. O seu caso mais conhecido foi com a duquesa Zinaida de Leuchtenberg, a esposa do seu primo Eugénio de Leuchtenberg. Como Eugénio estava em dificuldades financeiras profundas, aceitou que a sua esposa e o primo se encontrassem abertamente em público e até mesmo no seu palácio desde que Alexei os sustentasse.

Alexei e Zinaida
Embora o seu filho Alexei não fosse particularmente chegado aos Romanov de São Petersburgo, o grão-duque Sérgio Alexandrovich e a grã-duquesa Isabel Feodorovna parecem tê-lo tido em boa conta, visto que ele morava numa casa dentro da propriedade deles em Moscovo e foi nomeado ajudante-de-campo de Sérgio quando este se tornou Governador-geral da cidade.

Alexei Alexandrovich morreu em 1908, depois de se ter mudado para Paris alguns anos antes. Alexandra casou-se oficialmente com o barão Christian-Henrich von Wohrmann em 1875, quando o filho tinha apenas 4 anos e foi enviado para a Rússia novamente. Alexei, o filho de ambos, viria a ser assassinado por comunistas no Cáucaso entre 1930 e 1932.

Alexei, filho do grão-duque Alexei Alexandrovich e de Alexandra Zhukovskaya