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sexta-feira, 1 de junho de 2012

O Príncipe Filipe e os Romanov


A propósito das celebrações do Jubileu de Diamante da rainha Isabel II do Reino, o blog "Os Romanov" resolveu fazer uma pequena pesquisa em nome próprio sobre as relações familiares do seu consorte, o príncipe Filipe, mais especificamente o seu parentesco com a família imperial russa, os Romanov, que são mais próximas do que a maioria dos leitores terá alguma vez pensado.

De facto, estas relações são tão próximas que, aquando da descoberta dos corpos dos Romanov no início dos anos 90, o príncipe Filipe foi uma das pessoas que forneceu amostras de sangue para determinar o perfil de ADN dos mesmos. Mas vamos começar pelo principio.

O Lado do Pai

Príncipe André da Grécia e Dinamarca
Filipe é o filho mais novo do príncipe André da Grécia e Dinamarca e da princesa Alice de Battenberg. O seu pai, que durante alguns anos foi um militar muito respeitado na Grécia antes de ser injustamente acusado de crimes de guerra por ocasião da guerra greco-turca de 1919-1920, era filho do rei Jorge I da Grécia e da grã-duquesa Olga Constantinovna da Rússia, o que faz com que, logo aqui, encontremos uma ligação muito directa com os Romanov.

No entanto, Filipe parece ter tido pouco contacto com a sua avó paterna Olga uma vez que, quando tinha apenas alguns meses de idade, em Dezembro de 1922, a sua família foi forçada a fugir da Grécia depois de o seu pai ter escapado por pouco a uma sentença de morte e a monarquia ser abolida. Enquanto Filipe acompanhou os pais e as quatro irmãs para o exílio em Paris, a sua avó Olga foi para Itália e morreu em 1926, uma semana depois de Filipe completar cinco anos de idade.

A grã-duquesa Olga Constantinovna, avó paterna de Filipe

Além da sua avó Olga, Filipe tinha também uma relação de parentesco muito próxima com os Romanov no seu lado grego da família. A irmã mais velha do seu pai, a princesa Alexandra da Grécia e Dinamarca, tinha-se casado em Abril de 1889 com o grão-duque Paulo Alexandrovich da Rússia. Antes de morrer tragicamente depois de um parto prematuro, a tia paterna de Filipe teve dois filhos: a grã-duquesa Maria Pavlovna e o grão-duque Dmitri Pavlovich da Rússia. Isto faz então com que Filipe seja primo direito do assassino de Rasputine.

Devido a vários factores como a diferença de idades, o facto de a mãe deles ter morrido cedo e a distância que os separava, também não foram encontrados registos de que Filipe tivesse tido alguma relação próxima com estes dois primos, embora seja provável que os tenha conhecido, uma vez que tanto Maria como Dmitri passaram algum tempo exilados em Paris na mesma altura em que a família de Filipe se encontrava lá. Apesar de tudo, Filipe seria demasiado novo para se lembrar de tais encontros.

O grão-duque Dmitri Pavlovich e a grã-duquesa Maria Pavlovna eram primos direitos do príncipe Filipe

Outro dos irmãos do seu pai, o príncipe Nicolau da Grécia e da Dinamarca que, ele próprio, era muito chegado à família Romanov, como provam várias fotos da época, casou-se com a grã-duquesa Helena Vladimirovna da Rússia, filha do grão-duque Vladimir Alexandrovich e da grã-duquesa Maria Pavlovna Sénior. Neste caso, como a mãe de Filipe se tornou uma grande amiga de Helena quando ambas viviam na Grécia, existem registos de que ambos se encontraram várias vezes, principalmente depois de a monarquia ser restaurada na Grécia, altura em que o futuro consorte começou a passar sempre uma parte dos seus verões no país. Henry Channon, um socialite americano, recordou mesmo uma conversa que teve com Helena sobre o seu possível casamento com a princesa Isabel.

Nicolau da Grécia, tio paterno de Filipe, com o czar Nicolau II, o rei Jorge I da Grécia e a grã-duquesa Olga Alexandrovna
Filipe teve ainda a oportunidade de conviver de perto com um dos seus tios paternos que teve também um papel importante na história dos Romanov. O seu tio Jorge da Grécia e Dinamarca, conhecido por ter salvo Nicolau II do ataque de um japonês durante a Grande Digressão que ambos fizeram para completar os seus estudos, e a sua esposa Maria Bonaparte acolheram Filipe na sua casa em Paris depois de a sua mãe ser internada numa instituição de saúde mental e o seu pai ter partido para Monte Carlo. Foi mesmo Maria, que tinha estudado psicanálise com Freud, que recomendou os especialistas que diagnosticaram a mãe de Filipe com esquizofrenia. O casal também pagou os primeiros anos de escola de Filipe.

Maria Bonaparte e Jorge da Grécia e Dinamarca, tios paternos de Filipe

O Lado da Mãe

Alice de Battenberg, mãe do príncipe Filipe
Pelo lado da mãe, as ligações de Filipe aos Romanov são ainda mais evidentes e directas. Alice, que tinha recebido o nome em honra da sua avó materna, a princesa Alice do Reino Unido, era a filha mais velha da princesa Vitória de Hesse-Darmstadt e do seu marido, Luís de Battenberg. Vitória era irmã mais velha da grã-duquesa Isabel Feodorovna e da czarina Alexandra Feodorovna.

A relação de Filipe com a sua avó era muito forte, principalmente depois de a sua mãe ser internada quando o príncipe tinha pouco mais de seis anos de idade. Foi Vitória quem organizou a educação de Filipe e era ela quem decidia onde o neto iria passar as suas férias escolares. Era a principal responsável por Filipe e aquela que conseguiu manter alguma estabilidade na sua infância turbulenta. O duque de Edimburgo já falou muitas vezes da sua avó materna em várias entrevistas, sempre de forma carinhosa. "Admiro-a imensamente. Gostava muito dela. Era muito inteligente e culta. Tinha conversas fascinantes, sabia tudo, pelo menos do meu ponto de vista", disse, numa entrevista em 2011.

Vitória (esq.) avó materna de Filipe, com as irmãs Isabel Feodorovna e Alexandra Feodorovna

Embora Filipe não tenha tido muito contacto com as suas tias-avós russas, uma vez que nasceu três anos depois de elas morrerem, as suas irmãs mais velhas encontraram-se com a família Romanov pelo menos duas vezes, tendo em conta fotografias que existem da época. Os filhos do czar Nicolau II e da czarina Alexandra eram seus primos em segundo-grau.

Margarida e Teodora, irmãs mais velhas de Filipe, com as grã-duquesas Maria e Anastásia
Apesar de nunca ter conhecido Alexandra nem Isabel, Filipe passou muitas vezes férias com outra figura importante ligada à família Romanov: o grão-duque Ernesto Luís de Hesse-Darmstadt. De facto, outra das suas irmãs, a princesa Cecília, casou-se com o filho mais velho dele, o príncipe Jorge Donatus. Foi Cecília que deixou o testemunho de umas férias que Filipe passou em Darmstadt com Ernesto Luís, a sua esposa Leonor e o resto da família:

"Foi muito bom (...) O tio Ernie e a tia Onor deram-lhe [a Filipe] uma bicicleta nova nos anos e agora ele anda em cima dela o dia todo. À noite, desde que vai tomar banho até ir para a cama toca a grafonola que lhe deste. Este ano recebeu presentes muito bons. A Dolla [Teodora] e a Tiny [Sofia] deram-lhe canivetes e o Don [Jorge Donatus] deu-lhe uma grande bola colorida para ele brincar na piscina. Eu dei-lhe uma toalha para ele se deitar no jardim. Tem-se portado muito bem e faz tudo o que a tia Onor manda."

Ernesto Luís de Hesse-Darmstadt e Leonor de Solms, tios-avós  de Filipe, com o filho  Jorge Donatus, seu futuro cunhado
Quando foi para a escola em Inglaterra, Filipe começou a passar as suas férias de verão com um dos seus tios maternos, o marquês Jorge Mountbatten de Milford-Haven. Aqui encontramos mais uma ligação um pouco mais indirecta com os Romanov, uma vez que Jorge era casado com Nádia Mikhailovna de Torby, filha do grão-duque Miguel Mikhailovich da Rússia, um cunhado da grã-duquesa Xenia Alexandrovna. Por causa destas estadias, Filipe estabeleceu fortes amizades tanto com os filhos de Nádia como com os da sua irmã, Anastásia Mikhailovna de Torby. Jorge, que era também sobrinho de Isabel e Alexandra Feodorovna, também visitou os seus primos russos pelo menos uma vez.

Jorge Mountbatten, tio materno de Filipe, com as grã-duquesas Olga e Maria
Não foi possível encontrar testemunhos de Filipe em relação às suas relações familiares com os Romanov, no entanto, com o seu humor característico, Filipe respondeu da seguinte forma quando um jornalista lhe perguntou se gostaria de visitar a Rússia:

"Gostava muito de lá ir, embora essas bestas tenham assassinado metade da minha família"


Fontes

  • Eade Philip, "Young Prince Philip", Harper Press, 2011
  • BBC, "Prince Philip at 90", 2011

Xenia Alexandrovna no Exílio


Ao longo de toda a sua vida no exílio, a grã-duquesa Xenia fez os possíveis para manter certos aspectos da sua vida anterior. Começou a pintar novamente, vendendo alguns dos seus trabalhos a instituições de caridade. Agarrou-se aos seus criados russos, principalmente à lavadeira Anna Belousoff. A optimista Belousoff, que chegou a ter dez serventes e um cozinheiro, tinha sempre uma mala feita, pronta para um regresso iminente à Rússia. Tal como o príncipe Dmitri [filho de Xenia] recordou: "Ela costumava dizer: 'vamos regressar', e continuou a fazê-lo sempre até morrer com mais de noventa anos."

Xenia com a filha Irina
Mas a nostalgia que Xenia sentia pelo passado teve de se adaptar a assuntos mais urgentes, principalmente às suas finanças. Em 1921, o tutor dos seus filhos, Mr. Stewart, ajudou-a a abrir uma conta no banco Coutts, mas esta experiência começou mal: com mil libras de crédtico, Xenia gastou imediatamente noventa e oito no Harrods, uma soma equivalente a duas mil libras nos dias de hoje. Nesse mesmo ano, um encontro infeliz com um burlão americano custou-lhe dez mil libras. O homem tinha-lhe prometido milhões se ela investisse num inovador processo de impressão de fotografias. Foi preso depois de ter defraudado uma mulher e lhe ter ficado com o relógio, foi preso durante três meses e deportado para os Estados Unidos.

Xenia com a mãe Maria, a filha Irina e a neta Irina.
Nesta altura, o rei Jorge V decidiu intervir, tendo chegado a acordo para pagar duas mil e quatrocentas libras por ano à prima. Em 1925, decidiu também instala-la em Frogmore. A carta de agradecimento de Xenia é efusiva ao ponto de se tornar namorisqueira: "A sério Georgie, é muito bom e gentil da tua parte. Tive de te escrever imediatamente, mas estraguei muitas folhas de papel porque me sentia tímida! E não sabia bem o que estava a acontecer." Se soubesse que Jorge não tinha tentado salvar o czar, talvez Xenia não se sentisse tão agradecida.

O rei Jorge V do Reino Unido
Embora as suas necessidades práticas imediatas tivessem sido satisfeitas, Xenia teve ainda de enfrentar uma série de golpes inesperados. Após a morte de Lenine em 1924, os bolcheviques começaram a vender bens confiscados. Tesouros que tinham pertencido à família imperial começaram a aparecer em Inglaterra. A certa altura, um conhecido de Xenia mostrou-lhe uma caixa jade com uma coroa imperial estampada. "Tenho curiosidade em saber de quem seriam estas iniciais", disse ele. Quando Xenia respondeu: "São minhas," o homem, um coleccionador, voltou a colocar a caixa na janela e não disse nem mais uma palavra.

Xenia com o marido Sandro
Noutra ocasião, a rainha Maria apareceu com uma caixa cor-de-rosa onix Fabergé que servia para guardar cartas. Perguntou a Xenia o que achava dela. Xenia reconheceu-a imediatamente e disse: "Isso costumava estar em cima da minha escrivaninha". A partir daí, a rainha Maria passou a guardar a caixa num armário. Apesar de tudo, a rainha Maria não se sentiu minimamente mal por saber que a caixa de cartas pertencia a outra pessoa. A sua paixão por adquirir bens de outras pessoas era tão bem conhecida que os seus tesouros eram cuidadosamente escondidos dos seus convidados.

A rainha Maria do Reino Unido (Maria de Teck)
Em 1928, a dor de Xenia ao perder a mãe seria posta em segundo plano devido ao surgimento de uma campanha que apoiava uma mulher que dizia ser a sua sobrinha, a filha mais nova do czar, Anastásia. O processo que se seguiu, que foi o golpe final às já de si precárias finanças de Xenia, arrastar-se-ia ao longo de cinquenta anos. O problema da herança não se poderia resolver enquanto não se provasse que o czar, a esposa e os cinco filhos estavam mortos. Na década de 1930, Xenia visitou uma prima sua, a princesa Xenia Leeds, que acreditava na pretendente. A princesa tinha recebido 'Anastásia' na sua propriedade de Long Island durante vários meses e dizia que a sua suposta prima tinha reconhecido a voz do príncipe Dmitri do outro lado do campo de ténis.

Xenia Leeds, filha do grão-duque Jorge Mikhailovich, uma das únicas  Romanov que deu crédito a Anna  Anderson
Nos anos que se seguiram, as tragédia foram-se misturando com pequenas preocupações à medida que Xenia lutava para conseguir pagar sanitas, utensílios de cozinha e um serviço de água quente do governo britânico. As contas seguiam primeiro para o tesouro do estado, de onde eram posteriormente enviadas para o palácio real. "Uma vez que a grã-duquesa é muito pobre," explicou o gerente da fortuna privada do rei de forma severa, "o rei tem vindo a adquirir o hábito de pagar-lhe alterações e melhoramentos."

Xenia com dois dos seus netos
O rei Jorge V tinha tentado conter os gastos de Xenia durante vários anos, mas, em 1934, um surto de febre escarlate em Frogmore fez com que o seu sucessor, Eduardo VIII, sugerisse que Xenia se mudasse para Wilderness House, em Hampton Court. Os médicos tinham ficado alarmados quando encontraram mais de vinte convidados em Frogmore.

Xenia com a mãe Maria e o filho Rostislav
Foi construída uma capela ortodoxa na sala-de-estar de Wilderness House e Xenia instalou-se de forma satisfatória, não partilhando nenhuma das opiniões de Capability Brown que achava que a casa tinha "quartos desconfortáveis, uma cozinha ofensiva e escritórios maus."

Em 1938, o ambiente russo da casa de Xenia foi apimentado com a chegada de uma mística russa chamada Mãe Marta. "É uma freira (...) o Bertie e a Elizabeth conhecem-na," escreveu Xenia, de forma breve, numa carta dirigida à rainha Maria. A Mãe Marta tornou-se uma "figura controversa na família", como disse mais tarde um dos netos de Xenia, Alexandre. As pequenas princesas inglesas, Isabel e Margarida, tinham ficado muito surpreendidas com a sua parente russa, cantando a música "Volga Boat Song" [A Canção do Barco do Volga], sempre que passavam pela casa de Xenia. Agora ficaram ainda mais surpreendidas com a Mãe Marta, reparando principalmente nos seus pés grandes. Ambas as irmãs achavam que ela era um homem.

Isabel II e a irmã Margarida
James Pope-Hennessey, que visitou Xenia em finais da década de 1950, confirmou a opinião das duas irmãs, dando uma descrição elaborada do aspecto da Mãe Marta. "Usava uma touca de linho desarranjado e até mesmo amassado, cor de chá, atado na nuca com duas fitas. Tem a cara de um velho poderoso". Depois de terem passado pouco mais de vinte minutos juntos, Pope-Hennessey e Xenia foram interrompidos pela Mãe Marta, que tentou acabar com o encontro. Pope-Hennessey comparou imediatamente a grã-duquesa a um "pássaro selvagem excessivamente nervoso... encurralado". O facto de Xenia sentir pena desta freira melancólica pode ter sido um sinal da sua generosidade  ou da sua ingenuidade, que, segundo a grã-duquesa, estava "reduzida a esta existência, a saúde arruinada, os nervos abalados e eu sento-me e olho para ela, com o coração partido e mais preocupada do que as palavras podem descrever, acabando também por me sentir mal".


Xenia com a filha Irina e alguns dos seus netos
Xenia morreu em Hampton Court a 20 de Abril de 1960, rodeada pelos seus adorados netos. Segundo uma biografia: "A Mãe Marta apareceu carregando uma caixa com uma etiqueta a dizer 'véus negros de luto' que tinha sempre preparada para qualquer eventualidade". Depois do funeral desapareceu.

Xenia deixou 117,272.16 libras em testamento. Foi enterrada em Roquebrune, perto de Nicem ao lado do seu marido Sandro. No fim, o seu desejo de ser enterrada em Ai-Tudor, mas, segundo o seu filho Dmitri, Roquebrune foi escolhida por ser tão parecida com a Crimeia. 

Xenia em Inglaterra


Texto retirado do livro "The Russian Court at Sea" de Frances Welch.