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quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Um Pretendente no Século XVI

Não foram apenas os Romanov que tiveram pessoas a reclamar a sua identidade. Trezentos anos antes do aparecimento de Anna Anderson em Berlim, um nobre polaco surgiu em Moscovo, afirmando ser o czarevich Dmitri Ivanovich, um dos herdeiros do czar Ivan, o Terrível que tinha morrido em circunstâncias misteriosas dez anos antes.
A morte do czarevich Dmitri
A 15 de Maio de 1691, o meio-irmão mais novo do czar Fiodor I da Rússia, filho mais novo do sétimo casamento do czar Ivan, o Terrível com Maria Nagaya, aparece morto no jardim da sua casa em Uglich. A criança de oito anos foi encontrada com uma ferida fatal na garganta e um punhal por perto. Várias teorias surgiam imediatamente. A mais provável parecia ser a de que Dmitri se tinha ferido acidentalmente com o punhal depois de ter um ataque epiléptico enquanto jogava dardos, um jogo que, na Rússia da época, era jogado com as facas viradas ao contrário, mas muitos boiardos sentiam-se mais tentados a acusar Boris Godunov, o cunhado do czar que tinha uma grande influência no governo e que um dia se viria a tornar imperador da Rússia, de assassinar a criança. Havia ainda os que acreditavam que o suposto assassinato tinha sido obra de nobres polacos e lituanos que queriam conquistar a Rússia.
Boris Godunov
Depois de violentos protestos na cidade onde o czarevich vivia onde a população, que acreditava piamente que Dmitri tinha sido assassinado, queimou quinze pessoas, acusando-as de ser os assassinos, Boris Godunov ordenou que fosse feita uma investigação sobre a sua morte. Depois de ouvir várias testemunhas e de analisar os factos, os investigadores chegaram à conclusão de que a morte tinha sido acidental. A população e a mãe do czarevich aceitaram esta versão dos factos e o corpo foi enterrado sem grande alarido em Uglich.
Palácio onde Dmitri foi assassinado
Cerca de 1600, uma década depois destes acontecimentos e quando a Rússia passava por um período conturbado em que o czar, nesta altura já Boris Godunov, não conseguia controlar nem a população nem os boiardos, aparece um homem que afirma ser o falecido czarevich. A história que promoveu foi a de que a sua mãe tinha previsto que Godunov tentaria assassiná-lo, por isso entregou-o a um médico que o escondeu em vários mosteiros russos. Depois da morte do médico, o pretendente disse ter fugido para a Polónia onde foi professor antes de regressar à Rússia. Algumas pessoas que conheciam Dmitri disseram que o jovem se parecia com ele e tinha ares aristocráticos, sabia andar a cavalo, ler e escrever e falava polaco e russo. Até um dos boiardos que declarou a morte do czarevich Dmitri, Vassili Shuisky, que também seria czar, mudou a sua versão da história, afirmando que o morto tinha sido um amigo de Dmitri que brincava com ele.

Falso Dmitri I, o primeiro dos três que afirmaram ser o filho de Ivan, o Terrível

Apesar das qualidades do jovem, que mais tarde seria conhecido por Falso Dmitri I, a maior parte dos boiardos e a própria mãe do verdadeiro Dmitri não acreditaram que ele fosse a criança falecida dez anos antes o que, apesar de tudo, não impediu que apoiassem a sua pretenção ao trono. A maioria dos boiardos deu-lhe apoio imediato apenas para não pagarem impostos a Boris Godunov que consideravam seu igual e não poderoso o suficiente para ser czar. Além do apoio russo, Dmitri tinha já conseguido promessa de apoio militar por parte da Polónia e da Lituânia. Godunov acabaria por morrer antes do seu adversário conseguir alguma conquista efectiva, mas o seu filho e sucessor, Fiordor II, apanhado numa situação frágil de inicio de reinado, acabaria por ser preso e assassinado juntamente com a sua mãe pelos soldados fieis a Dmitri. O pretendente subiu ao trono no dia 21 de Julho de 1605.


O assassinato de Fiodor II e da sua mãe
Quando chegou ao trono com o nome de Dmitri II, mandou executar toda a família Godunov com a excepção da princesa Xenia Godunova que violou, prendeu e tornou sua comcumbina. Apesar de ser popular nos primeiros tempos do seu reinado, a sua popularidade começou depressa a decrescer devido a rumores fundados de que se tinha convertido secretamente ao catolicismo e planeava diminuir gradualmente o poder da Igreja Ortodoxa, principalmente pela presença de judeus no seu séquio real. Os rumores ganharam ainda mais força quando, em 1606, o czar se casou com Mariana Mniszech, uma nobre polaca católica.

Falso Dmitri I com a sua esposa
A queda de Dmitri foi tão rápida quanto a sua ascenção. Uma crónica da época afirma que, três dias depois do seu casamento, Dmitri mandou que se preparasse vitela assada à moda polaca, algo que fez os seus criados desconfiar seriamente da sua nacionalidade, visto que os russos ortodoxos consideravam a carne de vitela impura e imprópria para comer. A história espalhou-se rapidamente pela cidade, acompanhada de outros rumores mais antigos, de que o czar não tinha barba (quase obrigatória na época na Rússia), que já não ia à igreja, que não benzia perante o ícone de São Nicolau...

Na manhã de 17 de Julho de 1606, duas semanas depois do casamento, o kremlin é invadido por um grupo de boiardos liderados por Vassili Shuisky que, mais uma vez, mandara mudar a sua versão sobre a morte de Dmitri, afirmando que o czarevich tinha realmente morrido. Dmitri tentou fugir da multidão saltando de uma janela, mas partiu uma perna na tentativa, sendo morto pelos boiardos pouco depois.

Últimos momentos do Falso Dmitri I
Depois da morte de Dmitri, Vassili Shuisky tornou-se czar. Mais dois Dmitris apareceriam, o segundo em 1607 e o terceiro em 1612, mas nenhum conseguiu chegar tão longe como o primeiro. Para garantir que mais ninguém se voltaria a fazer passar pelo czarevich, Shuisky ordenou que o seu corpo fosse transladado com grande pompa e circunstância para Moscovo onde se encontra sepultado até aos dias de hoje. Mais tarde seria canonizado pela Igreja Ortodoxa Russa.

Dmitri Ivanovich como santo da Igreja Ortodoxa

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