Olga Nikolaevna com a tia Olga Alexandrovna em 1899 |
Um dia, na altura da Páscoa, fomos dar um passeio pela avenida de Nevski e a pequena grã-duquesa Olga não se estava a portar bem. Eu tentava falar com ela, tentando fazer com que se sentasse quieta quando, inesperadamente, ela me obedeceu, colocando as mãos muito educadamente no colo. Alguns segundos depois perguntou-me: “Viu aquele polícia?”. Respondi-lhe que isso não era nada de extraordinário e que o polícia não lhe ia fazer nada. Ela respondeu: “mas este estava a escrever alguma coisa, tive medo que estivesse a escrever que tinha visto a Olga e que ela se estava a portar muito mal.” Expliquei-lhe que isso era muito improvável e ela relembrou-me, de forma bastante indignada, que um dia, algum tempo antes, tinha visto uma mulher bêbada a ser presa na rua e que me tinha pedido para ir dizer ao polícia para não a magoar, e eu tinha-me “recusado a interferir e dito que a mulher se tinha portado muito mal e que o polícia tinha toda a razão por a estar a levar” . Nesta altura expliquei-lhe que uma pessoa tinha de ser bastante crescida e portar-se muito mal antes de a polícia levar alguém para a prisão. Quando voltamos a casa, ela perguntou a toda a gente se algum polícia tinha passado pelo palácio e perguntado por ela enquanto estivemos fora. Quando foi visitar os pais nessa tarde, contou tudo o que tinha acontecido ao pai, dizendo-lhe que eu lhe tinha dito que era bastante provável viver uma vida inteira sem ir para a prisão. Depois perguntou ao pai se ele alguma vez tinha estado preso e o imperador respondeu que nunca se tinha portado mal o suficiente para ir para a prisão, ao que ela respondeu: “Ah, então também te deves ter portado muito bem”.
Olga em 1899 |
Ficamos cerca de dois dias em São Petersburgo e depois regressamos a Czarskoe Selo. A primavera chega tão rapidamente na Rússia que quando regressamos, as paisagens já estavam verdes e magníficas, os pássaros já estavam a cantar e tudo estava lindo com a chegada da primavera.
Maria Alexandrovna |
Ficamos em Czarskoe Selo até ao início de Maio, quando nos mudamos para Peterhoff, a residência de verão no Golfo da Finlândia. Lá existem várias residências imperiais e o grande palácio é usado para cerimónias de estado. O parque é limitado pelo calmo Báltico de um lado. No horizonte vê-se a cidade de Kronstadt, rodeada pelos seus fortes. Há uma pequena igreja inglesa onde vive um capelão durante o verão que trabalha com os marinheiros. Kronstadt é o segundo lugar mais seguro do mundo e, até muito recentemente, era considerado impenetrável por causa do gelo. Contudo, a quebra do gelo mudou tudo. O lugar mais seguro do mundo é, claro, Gilbraltar.
As pequenas grã-duquesas começaram a ir regularmente à igreja desde bebés. Foi durante este ano que a grã-duquesa Olga começou a compreender o que lá se dizia. Chegou a casa um dia e disse-me: “o padre rezou pela mamã e pelo papá, pela Tatiana e por mim, pelos soldados, pelos marinheiros, os pobres doentes, as maçãs e as pêras e por Madame G.” Contestei quando falou desta última e ela respondeu-me: “Mas eu ouvi-o dizer ‘Maria Feodorovna’!” Então disse-lhe que se calhar se estava a referir à avó dela, mas ela protestou: “Não! A avó chama-se Amama [avó em dinamarquês], ou Sua Majestade, mas não se chama Maria Feodorovna.” Disse-lhe: “Também se chama Maria Feodorovna”, mas ela não aceitou: “ninguém tem mais de dois nomes e tenho a certeza que a Madame G. ia ficar muito contente se soubesse que os padres rezam sempre por ela na igreja.”
Olga Nikolaevna com a avó Maria Feodorovna |
Foi em Peterhoff, durante o quente mês de Junho, que nasceu a pequena grã-duquesa Maria. Penso muitas vezes que ela já nasceu boa, com o mínimo sinal do pecado original. O grão-duque Vladimir costumava chamar-lhe “o bebé amigável”, por ela ser tão boa e estar sempre a sorrir e alegre. É uma criança muito bonita e amorosa, com grandes olhos azuis-escuros e as sobrancelhas negras da família Romanov. Há pouco tempo, um cavalheiro ao falar dela disse que tinha o rosto de um anjo de Botticelli. Mas por muito boa e gentil que seja, também é muito humana, como as seguintes histórias vão mostrar. Um dia, quando ela ainda era muito pequena, estava no boudoir da imperatriz onde o imperador e a imperatriz estavam a tomar chá. A imperatriz tinha umas wafers pequenas com sabor a baunilha que se chamavam Biblichen, das quais as crianças gostavam muito, mas não tinham permissão para pedir nada enquanto estivessem na mesa. A imperatriz mandou-me chamar e quando cheguei a pequena Maria estava de pé, no meio da sala, com os olhos lavados em lágrimas e a engolir alguma coisa apressadamente. “Pronto! Comi tudo!”, disse ela, “Agora já não as podem comer!” Fiquei muito admirada e sugeri logo que se mandasse a criança para cama de castigo. A imperatriz disse: “Muito bem, leve-a”, mas o imperador interrompeu-a e pediu que a deixássemos ficar, dizendo: “Já estava com medo que lhe começassem a crescer as asas, ainda bem que ela é só uma criança humana.” Servia muitas vezes de exemplo para as suas irmãs mais velhas que declararam que ela era uma meia-irmã. Disse-lhes em vão que, nos contos de fadas, eram as irmãs mais velhas que eram as meias-irmãs e que a terceira é que era a irmã verdadeira. Elas não me ouviam e excluíam-na de todas as suas brincadeiras. Disse-lhes que ela não ia aguentar aquele comportamento para sempre e que, um dia, elas seriam castigadas. Um dia, as duas mais velhas fizeram uma casa com cadeiras numa ponta do berçário e não deixaram entrar a pobre Maria, dizendo-lhe que ela podia fazer de mordomo, mas que, para isso, tinha de ficar do lado de fora. Fiz outra casa do outro lado e ela brincou lá. De repente, a Maria correu para o outro lado do quarto, foi até à casa das irmãs, deu um estalo na cara a cada uma delas e foi para o quarto ao lado, voltando vestida com o manto de uma boneca e um chapéu e as mãos cheias de brinquedos pequenos. “Não vou ser o mordomo, vou ser a tia boa e gentil que dá brinquedos!”, disse ela. Depois distribuiu os brinquedos, beijou as suas “sobrinhas” e sentou-se. As irmãs dela olharam uma para a outra envergonhadas e depois a Tatiana disse: “Fomos tão más para a pobre Maria e ela não resistiu a bater-nos.” Aprenderam a lição e a partir daí passaram a dar-lhe os direitos de família que ela merecia.
Maria Nikolaevna |
Desde muito cedo que o amor pelo pai era muito visível. Quando ainda mal conseguia andar, a Maria tentava sempre fugir do berçário para ir ter com o papá e sempre que o via no jardim ou no parque, chamava-o. Se ele a ouvisse ou visse, esperava sempre por ela para a poder levar um pouco ao colo.
Maria Nikolaevna com a mãe Alexandra |
Texto retirado do livro "Six Years at the Russian Court" de Margaret Eager
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