Java

quarta-feira, 12 de agosto de 2015

A Morte de Maria Alexandrovna e o Segundo Casamento de Alexandre II

Alexandre II, Maria Alexandrovna e três dos seus filhos
Em Maio era costume a corte imperial mudar-se para Gatchina para assistir às manobras de verão ao mesmo tempo que o czarevich, o grão-duque Vladimir e as suas respectivas famílias partiam para as suas residências de verão. Embora estivesse a perder as suas forças, a czarina [Maria Alexandrovna] queria ir passar o verão a Gatchina e os médicos concordaram que ela o devia fazer se assim o entendesse. Tinha passado o outono e o inverno em Cannes e sentia-se bem o suficiente para viajar. Em Maio, a sua filha Maria foi avisada que já não restava muito tempo de vida à mãe, por isso decidiu viajar até à Rússia, para estar com ela. A duquesa de Edimburgo estava tão desencantada com a vida em Inglaterra sob a vigilância matriarcal da sua sogra, a rainha Vitória, que estava desejosa por arranjar alguma desculpa para poder regressar a casa. Apesar disso, ficou chocada quando descobriu que Catarina Dolgorouky, a amante do pai, e os seus filhos se tinham instalado em aposentos no Palácio de Inverno que ficavam directamente acima dos aposentos da sua mãe e teve uma discussão séria com o seu pai. Abalado por perder a sua última aliada na família, o czar partiu apressadamente para Gatchina antes dela para poder assistir às manobras militares. No entanto, a discussão com a filha pesou-lhe na consciência, já que regressava todas as manhãs a São Petersburgo para saber da saúde da esposa.

Alexandre II com a sua filha, a duquesa de Edimburgo
No entanto, no dia 3 de Junho de 1880, os sofrimentos da czarina Maria Alexandrovna terminaram quando ela morreu em paz enquanto dormia. No dia do funeral, que se realizou na catedral da Fortaleza de Pedro e Paulo, o czar carregou o caixão com a ajuda dos filhos desde a catedral até à sua sepultura, embora os seus filhos talvez considerassem com alguma amargura que Alexandre tinha contribuído para a sua morte. Uma vez que ainda era apenas uma dama-de-companhia, Catarina Dolgorouky não foi obrigada a estar presente.

A czarina Maria Alexandrovna nos seus últimos anos de vida
O viúvo passou então a estar livre para oficializar a sua relação com a mulher que já considerava ser a sua "verdadeira esposa perante Deus". Um mês após a morte de Maria Alexandrovna, apanhou o seu camareiro, o conde Adlerberg, quando o informou de que tencionava casar-se com a princesa Dolgorouky daí a uma semana numa divisão escondida do Palácio de Isabel em Czarskoe Selo, no mais profundo dos segredos. Alderberg questionou se não seria mais prudente esperar até que o herdeiro do trono e a sua esposa, que, na altura, estavam no estrangeiro, regressassem, mas o czar insistiu que não havia tempo a perder. De qualquer das formas, o conde já devia saber qual era a opinião do seu filho relativamente ao assunto. A Igreja Ortodoxa exigia no mínimo um período de luto de quarenta dias para viúvos. Segundo Alexandre, todos os dias havia o risco de ele vir a sofrer um atentado terrorista que o mataria e, por isso, "estava preocupado em garantir o futuro do ser que tinha vivido só para mim ao longo dos últimos quarenta anos", assim como o dos seus filhos com ela.


Catarina Dolgorukov
A 6/18 de Julho, os dois casaram-se num dos apartamentos do palácio em Czarskoe-Selo. Os únicos que os ajudaram a preparar-se foram o padre, um diácono e um corista. O czar vestiu o seu uniforme azul de hussardo da guarda e a princesa levou o seu casaco de dia beije preferido. Foi montado um pequeno altar com uma mesa com uma cruz em cima, o evangelho, duas lanternas, os anéis nupciais e as coroas. Quando o casal chegou, começou a cerimónia com dois ajudantes-de-campo a segurar as coroas matrimoniais por cima das cabeças do noivo e da noiva que estavam ajoelhados. Os preparativos para a cerimónia secreta tinham sido realizados com tal secretismo que não só não havia convidados nem tinham sido chamados os representantes de outras potências estrangeiras, como nem sequer tinham sido avisados os oficiais do governo, funcionários do palácio nem criados, excepto os que organizaram a cerimónia. No dia do casamento, o czar deu à sua nova esposa o título de Sua Alteza Sereníssima, a princesa Youriecsky e os seus filhos foram legitimados através de uma ukaze imperial. Quando o czarevich e a sua esposa regressaram da Dinamarca, o czar convocou-os à sua presença e comunicou-lhes a notícia, pedindo-lhes para a tratarem sempre bem. Alguns dias depois, Alexandre II chamou Loris-Melikov e pediu-lhe para o aconselhar relativamente ao título da sua esposa. Este admitiu que, embora não existe qualquer precedente de um czar que se tivesse casado uma segunda vez e tivesse coroado a sua segunda esposa imperatriz (Pedro, o Grande tinha-se divorciado da sua primeira esposa e ambas tinham sido coroadas imperatrizes), esses precedentes poderiam ser sempre criados por um autocrata.

Alexandre II
A decisão do czar foi condenada por todas as cortes europeias, apesar de a maior parte mostrar um certo nível de compreensão pela atitude. Em Berlim, a princesa-herdeira Vitória considerou que "penso que a pressa incrível com que o imperador se casou enquanto a corte estava ainda de luto pela pobre imperatriz poderá ser atribuída e, até certo ponto, justificada pela sua vontade de cumprir o dever de um homem honrado perante uma senhora e os seus filhos que ele tinha colocado numa situação muito dolorosa". Embora fosse quase impossível não sentir algum ressentimento pela falta de respeito demonstrada à memória da falecida imperatriz, "e por muito que os filhos tenham ficado magoados com o segundo casamento do pai, penso que é preferível que assim seja do que se tivessem continuado a sentir-se envergonhados da vida que ele vivia".

Vitória, princesa-herdeira da Alemanha
Os grão-duques mão podiam fazer nada relativamente à ordem do czar para que eles e as suas esposas jantassem com ele e com a sua nova esposa, mas as grã-duquesas nunca deixaram de tratá-la de forma fria e chamávam-na "aquela aventureira manipuladora". Na posição de filho mais velho da czarina e sendo aquele que mais ressentia a atitude do pai, o czarevich mostrava-se particularmente insensível. Pelo bem das boas maneiras, tal como os irmãos faziam, estava preparada para ser civilizada, mas não cortês perante a sua madrasta. No entanto, quando ela não estava presente, não hesitava em denunciar "a intrusa" que achava "manipuladora e imatura". Com trinta-e-três anos de idade, ela era apenas dois anos mais nova do que ele. Até chegou a considerar mudar-se com a esposa e os filhos para a Dinamarca, apesar de o momento de subir ao trono poder chegar a qualquer altura e isso não passar de uma ameaça sem conteúdo.

O czarevich Alexandre, futuro Alexandre III
Catarina não era tratada oficialmente como "Sua Majestade", mas o czar planeava coroá-la sua consorte numa data futura. Existe a teoria de que Loris-Melikov tinha sugerido que o casamento deveria ser anunciado publicamente, que ela deveria ser declarada imperatriz e que se deveria enfatizar o facto de, pela primeira vez na história da casa imperial, havia uma imperatriz que era realmente russa. Ao mesmo tempo, uma zemsky sobor, ou seja uma assembleia de delegados dos zemstvos, deveria ser convocada para colocar o regime czarista numa nova base constitucional e nacional. Alguns temiam que, se tal tivesse sido feito, teria surgido um movimento a favor de substituir o czarevich Alexandre por Jorge Alexandrovich Yourievsky, filho mais velho de Catarina e do czar. Embora Loris-Melikov pudesse considerar essa ideia viável, seria pouco provável. De qualquer das formas, o czar deixou claro em privado que, independentemente da relação que tinha com o seu filho, Alexandre era e continuaria a ser o seu herdeiro.


Jorge Alexandrovich Yourievsky, filho do czar Alexandre II e da sua segunda esposa, Catarina
Dentro da família, apenas os grão-duques Constantino e Miguel continuaram a apoiar completamente o irmão e a sua nova cunhada. Antes de levarem as suas esposas e filhos a São Petersburgo para os conhecerem, avisaram-nos de forma firme que tinham de estar preparados para conhecer a sua nova imperatriz, ignorando os protestos das suas esposas de que "ela" não era nenhuma imperatriz e relembrando-as que, como súbditos do czar, não tinham direito de criticar as suas decisões. A princesa seria coroada imperatriz assim que o período de luto pela "tia Maria" terminasse e, até lá, devia ser tratada como tal. Todos os filhos do grão-duque Miguel aceitaram o assunto sem problemas, apesar de ter terminado abruptamente a conversa quando um deles, o grão-duque Sérgio Mikhailovich, começou a fazer perguntas embaraçosas relativamente às origens da sua nova prima.

Grão-duque Miguel Mikhailovich
Alguns ministros, principalmente Loris-Melikov, aceitaram o casamento como algo perfeitamente razoável e procuraram sempre obter a amizade e apoio da princesa Yourievsky. O czar encontrou conforto na companhia da sua segunda família e, depois de passar uma hora com o seu filho mais velho do segundo casamento, Jorge (ou 'Gogo'), de oito anos, parecia estar sempre de bom-humor.

Catarina com os seus dois filhos mais velhos, Jorge e Olga
O grão-duque Alexandre Mikhailovich, sobrinho do czar, descreveu uma refeição em família na qual o czar, já com mais de sessenta anos, se comportou como um jovem de dezoito apaixonado, sussurrando palavras de encorajamento à sua esposa, perguntando-lhe se ela queria vinho, concordando com tudo o que ela dizia e satisfeito pelos membros mais jovens à mesa a terem aceitado. No fim do jantar, a governanta trouxe os seus filhos para a sala e o czar sentou Jorge no seu joelho. "Diz-nos, Gogo, qual é o teu nome completo?" ao que a criança de oito anos respondeu com orgulho: "Sou o príncipe Jorge Alexandrovich Yourievsky" enquanto brincava com as patilhas do pai com as suas mãozinhas. "Ficámos todos muito contentes por o ter na nossa presença, príncipe Yourievsky. Já agora, gostavas de ser grão-duque?" Quando ouviu esta pergunta, a princesa Youriesky corou profundamente. Foi uma manifestação de afecto paternal que o resto da família achou um quanto nauseabunda, principalmente a grã-duquesa Olga Feodrovna, esposa do grão-duque Miguel, que disse irritada ao marido que nunca na vida iria reconhecer aquela "aventureira calculista" que tinha separado a família e estava a "conspirar para arruinar o império".

Texto retirado do livro "The Romanovs: 1818-1959" de John van der Kiste

Sem comentários:

Enviar um comentário