Java

domingo, 6 de outubro de 2013

Carta de Maria Feodorovna ao seu filho Nicolau II



Esta foi a última carta que Nicolau II recebeu da sua mãe durante a sua vida. A carta foi escrita no dia 2 de Novembro de 1917. 

Querido Nicky, 

Acabei de receber a tua carta do dia 27 de Outubro, o que me encheu de alegria. Não consigo encontrar as palavras para expressar os meus sentimentos e agradecer-te com todo o meu coração, meu querido. Sabes que os meus pensamentos e orações nunca te deixam e penso em ti todo todos os dias e todas as noites e ás vezes sinto uma dor tão grande no coração que penso que não vou conseguir aguentar mais. Mas Deus é misericordioso. Ele vai dar-nos força durante este suplício. Graças a Deus que estás bem e que, pelo menos, vocês estão a viver juntos e confortáveis. Já passou um ano desde que tu e o querido Alexei vieram ver-me em Kieff. Quem poderia adivinhar na altura o que o futuro nos reservava, e pelo que teríamos de passar. É inacreditável. Vivo apenas nas minhas memórias do passado feliz e tento o melhor que posso esquecer este pesadelo. O Misha também me escreveu sobre o vosso último encontro na presença de testemunhas e [ilegível] e sobre a vossa partida horrenda e revoltante.

Recebi a tua primeira carta de 19 de Setembro e peço desculpa por não ter podido responder antes, mas a Xénia vai explicar-te o porquê. 

Lamento não te permitirem dar passeios, sei o quanto isso é necessário para ti e para as crianças; é uma crueldade incompreensível! 

Já recuperei bem de uma doença longa e aborrecida e já posso sair outra vez dois meses depois. 

O tempo tem estado muito bom, principalmente nestes últimos dias. Estamos a viver de forma muito modesta e calma e não vemos ninguém, já que não nos é permitido deixar a propriedade, o que é um grande incómodo. 

É uma bênção eu estar com a Xenia, a Olga e os meus netos que jantam comigo à vez todos os dias. O meu neto novo, o Tikhon é uma alegria para todos nós. Ele está cada vez maior e mais cheio e é tão querido, tão encantador e calmo. É um prazer ver a Olga tão feliz e satisfeita com o bebé que ela desejava há tanto tempo. 

Eles vivem muito confortavelmente acima da adega. Ela e a Xenia vêm ver-me todas as manhãs e tomámos o nosso cacau juntas, porque estamos sempre com fome. É tão difícil ter provisões, as coisas de que tenho mais saudades são o pão branco e a manteiga, mas ás vezes algumas pessoas bondosas manda-me um pouco disso: o Papa Felix [Yusupov, sénios] envia maçãs bravas e manteiga e estou-lhe muito grata. 

O príncipe Shervashidze chegou há pouco tempo. É muito agradável tê-lo, visto que ele é uma mais-valia, está sempre bem disposto e é divertido e está tão contente por estar aqui e descansar depois de ter estado em São Petersburgo, onde foi tão horrível. 

Fiquei muito feliz por receber aquelas cartas boas da Alix e dos meus netos, que escrevem todos tão bem. Agradeço e mando beijos para todos. Estamos sempre a pensar e a falar de ti. É tão triste estarmos separados, não podermos ver-nos uns aos outros, não podermos falar. Eu recebo cartas da Tia Alix e do Valdemar [os seus irmãos] de vez em quando, mas demoram sempre tanto a chegar e eu só posso esperar e desejar notícias. 

Compreendo muito bem o quanto deves gostar de voltar a ler as tuas velhas cartas e diários, apesar de um passado feliz despertem uma mágoa profunda no coração. Eu nem sequer tenho esse consolo, porque as minhas foram-me todas retiradas na Primavera quando me revistaram a casa. Todas as tuas cartas, todas as que recebi em Kieff, as cartas das crianças, três diários, etc., etc., e ainda não me devolveram nada, o que é revoltante e qual foi a razão disto, pergunto? 

Hoje é dia 2 de Novembro e é o aniversário do meu querido Misha. Penso que ele ainda está na cidade. Que Deus lhe dê saúde e felicidade. 

O tempo mudou de repente e está a soprar um vento forte e está frio, só estão 3 graus e, apesar de os quartos estarem aquecidos, não estão suficientemente quentes e as minhas mãos estão frias.

O Nikita foi ao K., o dentista [Kastritsky]. Foi através dele que eu soube novidades tuas. Fico feliz por saber que a pobre Alix não tem dores de dentes e que ele já acabou os teus tratamentos. 

Espero que a Isa B. [Buxhoeveden] tenha chegado com segurança e tenha recuperado da operação. Dá os meus cumprimentos a todos e também ao Il. Tatischeff, por favor. 

Que criados estão contigo? Espero que o Teteridtnikoff esteja convosco. Eu só fiquei com o Yaschick e o Poliakoff e não tenho palavras de elogio suficientes para eles, são pessoas tão esplêndidas e de confiança. Eles servem à mesa e conseguem fazê-lo muito bem. O Kukushkin e o Yashchik são grandes amigos e convivem muito. 

No dia 6 de Dezembro todos os meus pensamentos vão estar contigo, meu querido Nicky, e envio-te os meus melhores desejos. Que Deus te abençoe, Te envie força e paz e que não permita que a Rússia esmoreça. Muitos beijos. Que Cristo esteja contigo. Com muito carinho e amor da tua velha, 

Mama



quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Mais uma tragédia na família



Os Romanov não foram a única família a sofrer um final trágico entre os descendentes da rainha Vitória. O sobrinho de Alexandra, Jorge Donatus, filho do grão-duque Ernesto Luís, juntamente com a sua filha, também morreram de forma trágica em 1937. (Texto retirado do livro "Young Prince Philip" de Philip Eade): 

"Faltavam quatro dias para a nova data do casamento de Luís [de Hesse-Darmstadt. O casamento já tinha sido adiado anteriormente devido à morte do grão-duque Ernesto Luís] quando o seu irmão, Don [Jorge Donatus], o novo grão-duque e a sua esposa grávida, Cecília, irmã de Filipe [duque de Edimburgo, marido da rainha Isabel II], partiram na sua viagem trágica para Londres. Estavam acompanhados pelos seus dois filhos, Luís e Alexandre, pela dama-de-companhia de Cecília, Alice Hahn, a mãe de Don, que tinha ficado viúva recentemente, e o padrinho do noivo, Joachim von Riesdesel. Luís e a sua noiva esperavam a chegada da família no aeroporto de Croydon. Enquanto andavam de um lado para o outro, ansiosos, receberam a notícia de que o avião estava atrasado. Algum tempo depois, um oficial pediu discretamente a Luís que o acompanhasse a um escritório onde lhe contou o que tinha acontecido. Don, Cecília e os seus filhos deveriam ter ficado com os Mountbatten em Brook House e a filha de Luís Mountbatten, Patricia (actual condessa Mountbatten) lembra-se de "chegar a casa da escola quando vi o jornal a dizer que o avião se tinha despenhado, estava a caminho de casa, convencida de que os ia encontrar lá". O conde Mountbatten tinha mandado dois carros para o aeroporto, que regressavam agora apenas com o casal de noivos "completamente devastados", como recordou mais tarde. "Fomos todos para casa do pai da Peg e tivemos uma reunião de família horrível. A minha mãe disse que o casamento tinha de seguir em frente, não daí a quatro dias com todas as formalidades e publicidade, mas logo no dia seguinte, enquanto ainda estavam todos em estado de choque."

Na sua noite de núpcias, Luís e a esposa atravessaram o canal da mancha até Ostend, com muito mau tempo, para identificarem os restos mortais da família que tinham sido colocados dentro de onze caixões num hospital local e cobertos de flores pelas freiras que lá trabalhavam. No dia seguinte acompanharam os caixões no comboio funerário para Darmstadt. Assim que chegaram lá, adoptaram Joana, a única filha do casal que não estava a bordo. O casal nunca teve filhos."



A princesa Joana de Hesse-Darmstadt era o único membro da família que não estava presente no trágico acidente de avião que vitimou os pais, os irmãos e a avó paterna. Por ser demasiado nova, não tinha viajado com o resto da família e acabou por ser adoptada pelos tios, o príncipe Luís e a sua esposa, Margaret Campbell-Geddes. No entanto, o destino também não a poupou. Menos de dois anos depois do trágico acidente, a menina de dois anos e meio de idade não resistiu a um ataque de meningite e morreu, no dia 14 de Junho de 1939.

Rainha Vitória fala sobre a neta, a Imperatriz Alexandra Feodorovna



"Todos os meus receios sobre o seu futuro casamento se mostram agora de modo muito claro e o meu sangue gela-se quando pensa nela, tão jovem, colocada naquele trono tão inseguro, na sua vida, e acima de tudo no seu marido constantemente ameaçado e que apenas pode estar com ela em raras ocasiões. É uma ansiedade muito grande que se vem acrescentar aos meus últimos anos! Oh, como eu queria não perder a minha doce Alicky!" - Rainha Vitória numa carta dirigida à irmã mais velha de Alexandra, a princesa Vitória de Battenberg (21 de Outubro de 1894)

Relato sobre Maria Alexandrovna




"De toda a família imperial, a pessoa mais compreensiva era sem dúvida a imperatriz Maria Alexandrovna. Era sincera e, quando dizia algo de agradável, não tinha segundas intenções (...) Seguramente não era feliz na sua vida familiar; também não era apreciada pelas damas da corte, que a achavam demasiado severa, e não conseguiam compreender por que razão levara tão a peito as inconsiderações do seu marido." - Príncipe Pedro Alexeyvich Kropotkin (1842-1921)

quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Nicolau Alexandrovich, Czarevich da Rússia


O grão-duque Nicolau Alexandrovich, o czarevich, era um jovem alto e bonito, embora delicado e de constituição fraca. Tinha herdado o temperamento do pai e a mente interrogativa da mãe. Quando eram crianças, o czarevich e o seu irmão mais novo, Alexandre [futuro czar Alexandre III, criaram o seu mundo de fantasia, 'Mopopolis', retratado nos seus desenhos a tinta e caneta, uma cidade habitada por 'Mopses' ou cães pug. Durante a Guerra da Crimeia, os ingleses passaram, naturalmente, a ser detestados na corte russa, mas os rapazes tiveram a sensatez de não tornar a sua sátira demasiado óbvia e resolveram retratar os seus inimigos simplesmente como bulldogs. Como era herdeiro do trono, Nicolau era por vezes tratado com severidade pelo pai que, surpreendentemente, não foi tão compreensivo com ele como o seu pai tinha sido consigo. Nicolau, um jovem sensível que se parecia muito com o pai durante a adolescência, por vezes era tratado com impaciência por ele por este o considerar um pouco efeminado. Era provável que o czar o quisesse preparar de forma adequada para a vida dura que o esperava, mas se tal era o caso, mostrou-de de forma muito brusca. A sua mãe, que achava que o filho tinha uma inteligência semelhante à sua, dedicou-se tanto às suas necessidades que às vezes quase parecia que se esquecia dos seus outros filhos. Era uma criança avançada e a sua inteligência desenvolveu-se muito depressa, levando-o a fazer perguntas sérias que, ao mesmo tempo, impressionavam e assustavam os seus tutores. O seu governador, o conde Stroganov, referiu mesmo que a sua maturidade de pensamento e expressão quase pareciam pouco saudáveis numa pessoa tão nova.

Nicolau Alexandrovich com a sua mãe, a czarina Maria Alexandrovna
Em Setembro de 1864, o czarevich completou vinte-e-cinco anos de idade. O jovem precoce tornou-se num adulto estudioso com os conhecimentos liberais do pai, grandes interesses artísticos e muita graciosidade. No geral, tinha muito poucas parecenças com o resto dos seus irmãos que eram mais agitados. Uma certa fragilidade no seu físico denunciava a sua saúde delicada. Durante a adolescência, segundo alguns relatos, Nicolau desafiou um dos seus primos, o príncipe Nicolau de Leuchtenberg, para uma luta amigável durante a qual foi atirado ao chão e não se conseguiu mexer durante alguns minutos. Segundo outro relato, o czarevich fracturou a coluna depois de cair do cavalo na escola de cavalaria de Czarskoe-Selo. Qualquer que seja a verdadeira versão da história, estes ferimentos voltariam a atormentá-lo alguns anos depois. 


Nicolau Alexandrovich
No verão, o rei Cristiano IX da Dinamarca recebeu oficialmente uma proposta de casamento em nome do czarevich, para a sua segunda filha solteira, a princesa Dagmar. O rei deu o seu consentimento, colocando a única condição de deixar a sua filha decidir o que queria por si própria depois de o conhecer. O czarevich recebeu uma fotografia dela e passou a trazê-la sempre consigo a partir daí. Apesar de não ser tão bonita como a irmã mais velha, a princesa Alexandra, que se tinha casado com o príncipe de Gales no ano anterior, Dagmar tinha mais personalidade, uma sagacidade mais acentuada e interesses mais variados, bem como o mesmo gosto em termos de estilo e paixão por roupas bonitas. 


Dagmar da Dinamarca, futura czarina Maria Feodorovna da Rússia

Acompanhado do conde Stroganov e uma grande comitiva, o czarevich partiu da Rússia em Junho de 1864 e encontrou-se com a família real dinamarquesa em Fredensborg, onde a princesa brilhou com a frescura dos seus dezasseis anos. Os dois jovens foram pressionados a esperar mais algum tempo e, entretanto, o czarevich partiu para Berlim para assistir a manobras militares com o pai. Na noite anterior sentiu fortes dores nas costas e apesar de se sentir mal insistiu em cumprir os seus compromissos, mas depois de passar onze horas a cavalo, chegou ao fim do dia exausto. Esperando que as dores não significassem nada pior, regressou a Copenhaga para pedir a princesa Dagmar em casamento. Entre grandes festejos familiares, foi anunciado que os dois se casariam na primavera seguinte, depois de Nicolau terminar o seu longo programa de visitas culturais pelo resto da Europa.

Fotografia tirada para celebrar o noivado de Nicolau Alexandrovich e Dagmar da Dinamarca
Em Itália, Nicolau interrompeu o itinerário para visitar a mãe, que tinha trocado o inverno rigoroso de São Petersburgo por um período de férias na Riviera. (...) A dor nas costas tinha voltado em força e o jovem ficou de cama durante várias semanas enquanto recebia tratamento para um abcesso. Oficialmente, o único mal do qual o czarevich padecia era reumatismo e talvez um pouco de malária, mas as dores de cabeça e enjoos persistentes levaram a família a temer o pior. Nicolau estava demasiado fraco para regressar a casa e a havia discordância entre os médicos e especialistas em relação à sua doença começava a causar alarme.


No inicio de 1865, era evidente que o czarevich estava a perder a sua batalha. Alojado na Villa Diesbach, em Nice, foi examinado por dois médicos que não viram nada de perigoso no seu estado de saúde, mas em Março queixou-se que o barulho das ondas na costa não o deixava dormir. Uma vez, quando o mar estava meramente a enrolar-se suavemente na areia, esta sensibilidade extrema aos sons foi vista como um mau sinal. Nicolau foi levado mais para o interior, para a Villa Bermond, mas quando chegou a Páscoa era óbvio que não se ia salvar. Muitos parentes desgostosos, incluindo a princesa Dagmar e membros da família dela, dirigiram-se para o seu leito de morte. A czararina não o deixava por nada e as suas damas-de-companhia estavam tão histéricas que o conde Stroganov ordenou bruscamente que todos aqueles que não se conseguissem controlar deviam sair do quarto imediatamente. Entre elas encontrava-se a princesa Maria Meshchersky que se dizia ter uma relação amorosa com o grão-duque Alexandre [Alexandre III]. Se a senhora tinha ainda esperanças de se tornar esposa do grão-duque ou seguir o mesmo caminho do irmão destituído da czarina, o príncipe Alexandre de Hesse [que se casou com uma plebeia, criando o ramo Battenberg], agora compreendia que, a não ser que os médicos fizessem um milagre, essas esperanças não levariam a nada. Quando o czar chegou à villa, a czarina acordou Nicolau para o avisar. Nicolau beijou-lhe a mão, segurando um dedo de cada vez e perguntou-lhe o que faria ela sem ele. Uma vez que foi a primeira vez que ele falou na sua morte, o pai ajoelhou-se na cama, chorando silenciosamente.


No dia seguinte, Dagmar praticamente não deixou o seu lugar junto ao leito, arranjando as almofadas e acariciando-lhe o cabelo, falando sempre suavemente. (...) Na noite de 24 de Abril, ao mesmo tempo que os marinheiros russos e infantaria e cavalaria francesa organizavam uma vigilia silenciosa no lado de fora da vila, a família, os criados e médicos enchiam o quarto. Um grupo de clérigos cantava rezas para o moribundo à medida que o jovem magro e exausto de vinte-e-um anos se apagava.

John Van Der Kiste - "The Romanovs 1818-1959"

The Life and Times of Lord Mountbatten

Neste vídeo extraordinário, que faz parte de um documentário produzido em 1969 sobre a vida do Lord Luís Mountbatten, sobrinho da czarina Alexandra, o próprio fala dos seus parentes Romanov, incluindo as primas Olga, Tatiana, Maria e Anastásia, bem como de Alexei, Nicolau e até Isabel Feodorovna. Um verdadeiro tesouro para quem sempre quis ouvir histórias sobre os Romanov da parte de uma pessoa que os conheceu pessoalmente! O vídeo está em inglês, mas farei os possíveis para disponibilizar uma versão legendada!

 
The.Life.and.Times.of.Lord.Mountbatten.02of12... por waja100